3.11.05

Estão os homossexuais “in”?

O trauma não sarado: retomo o texto de anteontem, regresso ao programa televisivo que mascara brutos exemplares do machismo lusitano em adocicados, gentis, “fashionable” homens. Dei comigo a pensar: por que insondáveis mistérios terão os responsáveis pelo formato televisivo achado que uma pandilha de efeminados gays seria a chancela para a transformação de candidatos disformes em perfeitos exemplares do que está na moda?

Duas hipóteses, uma simpática para a causa homossexual, outra com contornos homofóbicos. Primeira hipótese: a síntese de que os homossexuais têm uma espécie de sensibilidade feminina que os predispõe para tarefas para as quais os homens com apetência heterossexual não estão fadados. Segunda hipótese: o canal de televisão foi no engodo do politicamente correcto, contribuindo para o peditório da “normalização” da homossexualidade. Mas, ao querer passar a imagem de que ser homossexual é tão natural como ser heterossexual (asserção que tem a minha concordância), embrulhou o programa num molde que expõe os homossexuais ao ridículo (pelo menos os que ali dão a cara). Um pouco por culpa das abichanadas figuras escolhidas para o programa, pois resvalam para os tiques excessivos que levam tanta gente a parodiar a sua opção de vida.

Não são as intenções dos mentores do programa que me interessam. Quero perceber porque motivo é passada a imagem de que um grupo de gays tem os predicados ideais para transformar a imagem de uma abrutalhada figura que, antes de se entregar aos cuidados dos terapeutas de imagem, destila mau gosto por todos os poros. Não haverá homens sem sexualidade alternativa com qualidades para saber o que está na moda? Estarão os heterossexuais aquém dos padrões da estética aceitável? A mensagem do programa é a de que os heterossexuais estão “fora de moda”, que só os homossexuais reúnem aquele predicado.

Seria bastante para discutir mais uma ramificação da tenebrosa discriminação positiva que, no fundo, enclausura numa armadilha os paladinos da mirífica igualdade. Dando de barato que todos somos iguais – truque de retórica que acalenta uma ilusão que mobiliza ideologias bem comportadas – no final descobre-se que há quem seja mais igual. Desfazendo o mito da igualdade.

Não é pela epistemologia da igualdade que quero descobrir o fio à meada. Apenas atestar que se queremos, heterossexuais de gema, estar no grito da moda, que nos entreguemos aos cuidados de apaneleirados consultores. Como se fossem divinas figuras que, do alto da sua efeminada sensibilidade, com os trejeitos das femininas figuras que gostariam de ser, estão empossados na suprema arte do bom gosto. Eles, melhor que ninguém, sabem como combinar diferentes peças de roupa, sabem que mobiliário que se compagina com o binómio proprietário-habitação, sabem como compor o penteado, sabem quais são as boas maneiras à mesa, ensinam os truques do “estar bem” numa cerimónia solene. Os que optaram pela heterossexualidade, desprovidos destas qualidades. Selvagens que necessitam de domesticação operada por estes consultores do “bien-être”.

Ou isto, ou a estação televisiva que se aproveitou da onda de “banalização” da homossexualidade (especialmente da masculina, porque a feminina parece andar arredada desta moda, para desgosto de homenzarrões que têm fantasias com lésbicas…) para expor uma pandilha de folclóricos adeptos da alternativa sexualidade. Mau serviço à causa homossexual: pelas tristes figuras dos exemplares expostos, pela vulgarização (coisa diferente da banalização) da homossexualidade. E porque, com formatos destes, a homossexualidade há-de continuar a ser motivo de desprezo para grande parte da população que não resiste a atirar piropos aos espécimes que representam a causa.

Esta é a imagem de um estranho mundo a preto e branco: de um lado, os heterossexuais, alijados de bom gosto, das boas maneiras, da boa educação, mister da embrutecida sensibilidade masculina; do outro lado, homossexuais dotados de uma sensibilidade feminina, cultores de tudo aquilo que falta aos homens que gostam apenas de mulheres. Como gosto de ver o mundo no esplendor da sua policromia, só posso desdenhar do quadro a preto e branco que exibições do género nos legam.

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