9.6.09

O povo é burro (imagens dos derrotados nas eleições)



Há um gosto perverso quando o contentamento se destila ao ver os rostos tristes de quem perdeu eleições. Que me interessam os ganhadores? Pouco. A não ser sabê-los esfuziantes com a vitória. Bom proveito.

Entre a gente nitidamente mal disposta houve alguém que captou a minha atenção: Ana Gomes, que apareceu duas vezes com cara de pouco amigos. E como ela estava com maus fígados! Já não me metia com a ponta de lança do MRPP dentro do PS há muito tempo. À entrada do hotel onde a seita se reuniu, foi logo debitando moralismos sobre a abstenção muito elevada. Ainda não havia resultados, nem sequer projecções anunciadas pelos canais de televisão. Porventura alguém do aparelho já tinha segredado à D. Gomes que a coisa ia correr mal para a seita. Era bom que se começassem a preparar para uma derrota retumbante. Duplamente retumbante, pois os astrólogos das sondagens jamais a tinham previsto nas sucessivas sondagens que iam vomitando. As derrotas, quando são inesperadas, custam mais a digerir.


Comecei a suspeitar de um resultado surpreendente quando olhei para o rosto carregado da D. Gomes e para a maneira como se atirou aos abstencionistas – esses malvados, indignos dos sacrifícios por que passaram os paladinos da liberdade que, em alguns casos, pagaram com a vida a luta pela liberdade. Sabemos que a D. Gomes sofre de incontinência verbal. E sabemos que deve andar a contas com uma tremenda azia, porque há poucos dias o ministério público arquivou o caso dos voos clandestinos dos serviços secretos dos Estados Unidos que fizeram escala técnica em aeroportos domésticos a caminho da tortura de Guantánamo. Temos que compreender a decepção de alguém quando uma cruzada pessoal se salda pelo insucesso. Descontando isso, havia ali naquelas palavras dirigidas aos abstencionistas um ódio mal disfarçado, o sinal de que eles seriam os culpados por algo de mal que estava para acontecer ao PS. A noite eleitoral prometia-se entusiasmante.


Segundo episódio: a D. Gomes estava com umas trombas que metiam medo quando o desastrado cabeça de lista, na companhia do "grande líder", fez o discurso que selava a derrota. Foram uns segundos, uns segundos só, mas tão deliciosos, quando uma câmara fez um grande plano da D. Gomes. É do conhecimento geral, a senhora não deve nada à beleza. Menos agora que, como ela confessou num inquérito que o Público passou entre eurodeputados, engordou dez quilos na vida airada entre Bruxelas, Estrasburgo e muitas viagens mundo fora em representação do Parlamento Europeu. Toda aquela feiura se adensa quando o rosto se encerra numa carrancuda forma.


Pus-me a adivinhar os pensamentos que percorriam o íntimo da D. Gomes. Como ela diria, para os seus botões: que ignaro é este povo! Ó gente desprovida de inteligência, que não soubeste premiar uma lista de excepcional calibre e a puniste por andares cansada do governo do "grande líder". Se calhar – avançou a hipótese, numa humilde auto-culpa – os candidatos da lista falharam durante a campanha eleitoral. Em vez de andarem entretidos na lavagem de roupa suja da política caseira, deviam ter falado da Europa. E explicado aos eleitores, em tom pedagógico (até tinham matéria-prima de primeira água: pois o cabeça de lista não é um eminente professor universitário, e logo da digníssima escola coimbrã?), que estas eleições não eram um plebiscito ao governo nem ao "grande líder". Arrisco a adivinhar outro pensamento que terá vogado no espírito da D. Gomes: ela a olhar para o "grande líder" no púlpito, a partilhar a sua também tromba de mal disposto, e a acusá-lo de ser o culpado pelo descalabro nestas eleições. Nem sei se a D. Gomes, que reúne os predicados de uma vingativa alma, não terá ali mesmo prometido um vudu ao "grande líder". Que as eleições legislativas demoram só três meses.


A D. Gomes estava com cara de poucos amigos. Se pudesse, dava uma lição ao povo. Mas só ao que não quis ir votar e ao que escolheu os adversários que, como ela tem a certeza e todos devíamos saber, não chegam aos calcanhares da seita socialista. Isto das eleições é um aborrecimento. Só devia haver eleições se o PS ganhasse. Aí sim, festarola noite dentro e um sorriso de orelha a orelha em vez do carrancudo rosto a que tivemos direito por uns breves, mas tão deliciosos, segundos.


(Em Coimbra)

2 comentários:

Milu disse...

Penso que você é uma pessoa de ideias e que tem muito talento para escrever. Gosto muito de o ler. No entanto, neste texto mostrou que tal como o mais comum ser humano, exige que a mulher além de lutar pelo que acredita e além da sua competência, tem também de ser bonita, e se não o for, o reconhecimento do seu trabalho ficará sempre pela metade!
Precisamente o contrário daquilo que nós mulheres fazemos! Se eu julgasse o trabalho de um homem pelo seu aspecto, havia de ser o bonito. No panorama político nacional com raras excepções são todos bem nutridos, com faces flácidas e duplo ou mesmo triplo queixo e sei lá que mais, que imagino horrível. Como ícone máximo temos o presidente da Madeira, que até mete nojo, faz-me lembrar uma porca prenhe e, não vejo, que alguém utilize a sua triste figura para o diminuir, que aqui sim, seria bem justo!

Anónimo disse...

Corroboro essa ideia do talento para a escrita. Pena é que PVM, por vezes, muitas vezes, a use com desvios de machista anarca zangado com o mundo. Não se adequa sequer ao seu perfil impecável.

Por este post se adivinha uma alegria interior com os resultados eleitorais. Bem como uma vã gloria de pertencer aos bonitos deste mundo. Em ambos os casos, um erro. Merecemos melhor do PVM.

MLV