13.5.11

Solilóquio


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As paredes diante dos olhos são a inércia que aprisiona o pensamento. Não te emprestes à melancolia. Arruína os arrumados esqueletos que se compõem por dentro. Essas ossaturas apodrecidas retêm as impurezas que catalisaram os pesares que te pereciam. A cada passo que os teus dedos remexem nesses esqueletos, avivam-se as mágoas que julgavas sepultadas.
Aproveita os dias soalheiros. Deixa que eles invadam as veias com a sua ledice. Desvia os olhos das imagens que incineram as veias. Deixa os tumultos interiores para os dias em que tempestades a sério forem tuas visitas. Poupa-te para os combates contra ventos enfurecidos que descompõem até os alicerces. Os dias viçosos, esses, merecem homenagens singulares. Senão, regressas às impurezas de outrora, aquelas impurezas que te consumiam por dentro, que tornavam os dias uma escuridão indomável por onde o teu corpo tacteava, incerto.
Olha nos olhos o que te traz recompensas. Abjura o precipício onde o corpo mergulha em seu sofrimento. Não sejas mesquinho ao ponto de te arvorares o teu maior inimigo. Às voltas com as encruzilhadas, atalha por onde o instinto sussurrar ao ouvido. O impasse é o vazio anódino. Uma mortalha que exulta uma aparência vicejante e que, todavia, esconde debaixo da epiderme um veneno letal. Se essa mortalha te abraçar por tempo demorado, ficarás tomado pelo veneno que já não se larga de ti. Os sobressaltos enquistados no pretérito são um ensinamento. Não sucumbas ao assalto suicida de tomar entre mãos os frutos repugnantes, os frutos que escorrem um engodo que aprisiona à letargia.
Os ensinamentos colhidos do outrora são a pedagogia da existência. Chamam-lhe experiência. É falta de lucidez teimar nos tropeções de antanho que desenharam mortificações. É em ti que reside a manha para sair das emboscadas. Daquelas fermentadas por palavras exteriores. E, as piores, daquelas que se avivam em ti e se soerguem derrotando as forças que rejubilam pelas paredes das veias em incandescência. É uma luta desigual – protestas. E nem por aí consegues discernir o bem que te é legado nesta existência. O desassossego tem as suas páginas na agenda, como é dado a toda a gente. Olha por detrás do ombro, em retrospectiva; e diz, em plena justiça, se arregimentas motivos de queixa.
Eis o desafio marcado com o teu sangue: presta homenagem a ti mesmo. Renega os fantasmas sórdidos que esvoaçam no quintal da tua imaginação. Rasga as inseguranças que amarram às perplexidades que te angustiam. Há uma miríade de coisas por ver, palavras por experimentar, descobertas e redescobertas. E já que não marcas compasso com a harmonia intemporal, aprende que isso semeia as pontuais dores que te trazem em solavancos. Um dia pode ser sombrio, tristonho, ainda que por entre os teus maiores esforços não consigas descobrir a causa para o ser. Não te deixes derrotar. A ninguém é dado experimentar todos os dias soalheiros, como se houvesse uma perene primavera a circular por dentro deles. Abdica das imagens pretensiosas e complexas que são anticorpos de um porvir radioso. Empresta-te à simplicidade de tudo. E verás que esse tudo embrulhado numa intrépida simplicidade é o resguardo mesmo à frente dos teus olhos.
Só tens que destruir a miopia do olhar.

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