21.11.11

A semântica dos impostos

In http://www.igrejagape.com.br/wp-content/uploads/2011/04/ladrao.jpg
Sentado à janela enquanto o metro avançava de estação em estação, só ao fim de uns minutos de viagem os olhos se detiveram num cartaz com letras visíveis à distância. Anunciava descontos nos passes mensais para gente menos endinheirada. Os impostos que pagavam faziam prova da míngua de recursos. À segunda leitura (a primeira foi na diagonal), os olhos pararam na expressão “sujeito passivo”. É assim que os contribuintes de impostos são tratados pela semântica oficial. Não deve ser inocente.
Daí que se imponha a necessária hermenêutica. Haverá diferença entre sermos tratados por “contribuintes” ou por “sujeitos passivos” se pagamos impostos à mesma? Dirão: tanto faz, chamem-nos como chamarem havemos de pagar impostos. A categoria que se nos pespega é irrelevante. Talvez não seja. Quando o recebedor de impostos nos trata por sujeitos passivos e apaga da linguagem oficial a possibilidade de sermos os seus contribuintes, há todo um programa de intenções.
Se o cobrador de fraque nos chamasse contribuintes, assumia a humilde posição de quem recebe os impostos como contribuições (voluntárias ou não, pouco interessa para o caso) de quem se põe a jeito de os pagar. É quem paga os impostos que financia o Estado. Mas não vá este reconhecer a sua fragilidade se admitisse que são os contribuintes que o mantêm de pé, arranjou-se uma semântica que mudasse as cores da psicologia relacional entre quem recebe e quem paga impostos. Qual contribuintes qual quê? Sujeitos passivos é que demonstra a relação autoritária que o Estado (ou certos Estados, com selo socialista) adora exibir.
Quando somos tratados como sujeitos passivos fica à mostra a qualidade da relação entre o cobrador de fraque e quem paga os impostos: somos os passivos da relação. Outra vez de repente, veio à lembrança a maneira como são tratados os parceiros de uma relação homossexual masculina. Um é passivo, o outro é ativo. Se a comparação transbordar para a semântica dos impostos, está tudo dito. E explicado como e porque somos sujeitos passivos.

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