7.6.12

Nevoeiro amarelo


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(Exercício de escrita criativa, ou pelo menos tentativa)
A manhã, esperada com orvalho, nascera com uma humidade omissa que deixara os meteorologistas perplexos.
Notava-se em redor, os pássaros siando sobre os lagos do jardim para humedecerem os bicos. Mas se reescrevermos a frase, o caso muda de figura. A manhã, esperada com orvalho, nascera com uma ausência de humidade. Os meteorologistas estavam a dormir, mesmo os que estiveram de plantão pela noite fora. Foram atraiçoados pela distração e sono. E só os pássaros atarantados deram conta do fenómeno atmosférico, siando destemperadamente sobre os lagos como se quisessem sorver toda a água lacustre. Os meteorologistas já eram cartas fora do baralho.
Mas o cenário podia mudar, refazendo-se a frase do início. A manhã fora omissa em humidade. O orvalho decaíra na função. A secura inesperada vinha acompanhada por uma subtil neblina onde se depositavam partículas de uma poeira que adejava. Era um nevoeiro amarelo. Os meteorologistas continuavam atados ao seu torpor. Os pássaros ensaiavam coreografias caóticas, tão desordenados os voos quanto as mudanças de rumo a que metiam asas. Nem os lagos sabiam encontrar. As aves começaram a chover sobre as ruas e os transeuntes. Umas esgotadas pela exaustão, outras em decesso. As pessoas que haviam madrugado davam conta do insólito. Não precisaram de testemunhar a precipitação de aves inertes. Já tinham sentido a garganta secar num ápice, o vento acre tisnando a pele apesar de o sol ainda se erguer envergonhado sobre o fio do horizonte.
Ou, numa tentativa final de reconfiguração da frase, hipostasiava-se que os meteorologistas madrugadores, com encontro marcado com o orvalho da estacão, foram traídos pela ausente humidade que contrariava os sempre exatos modelos em que se inspiravam. Outra vez, os humoristas viriam em seu desabono. Comparando-os aos mais vilipendiados de todos, por estes dias de doentia escassez de tudo (os economistas). Os meteorologistas, afobados pela desonrosa comparação, encomendaram ao santo das previsões do tempo uma madrugada rançosa que desaguasse no habitual orvalho.
O nevoeiro amarelo não fazia parte do seu léxico.

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