26.6.13

Sobre a toxicidade do ego


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As noites são o epílogo? Afaste-se a ideia de que as noites são um ocaso, como se fosse preciso reavivar que a todos está fadado um ocaso. Isso é desconhecer que há os eternos. Os que deixam marca indelével nos amanheceres que virão depois. Esses, do alto das suas admiráveis pessoas, são dádivas para a humanidade. Nem que de si tenham medida maior que a providenciada pelos espelhos onde, demorados, se autocontemplam.
Tem de haver figuras maiores. Protagonistas. Eles não se podem esconder. Não lhes é dada se não a gratidão dos outros quando se inclinam diante da grandeza com que ungem a humanidade. São uma sonata melodiosa que encanta os ouvidos dos outros. Sem direito a dissidências, que as que houver ou serão frenesim da inveja ou maceram num autismo doentio. A humanidade toda devia-se curvar perante as notabilidades da espécie. Quem os pode apedrejar pelo libelo de se esconderem da humildade? Aos grandes só é permitido o reconhecimento da sua elevada estatura. Se a eles vier a altivez, é um preço normal que os demais suportam. Uma compensação pelos eméritos serviços à humanidade.
Mereciam espelhos dourados, para se fitarem em complacentes autoelogios que aprovam o fausto que os indulta. Os demais, os da estatura mortal, não podem hipotecar a aura que se agiganta com o luar que cintila sobre as suas predestinadas mentes. E ai daqueles que ousarem duvidar. A mortal condição é a expressão da sua finitude. Que não lhes seja admitido o topete de ultrajar as proezas que sobram do pretérito. O tempo que passou é a credencial dos feitos assimilados. Mal são credenciados, sobre eles se investe um manto dourado que não admite reticências.
Podiam as eminências pardas voltar ao terreiro onde todas as ideias, todas as palavras, as proezas de qualquer estirpe, voltassem a ser examinadas. Nessa altura, saber-se-ia que a oligarquia protege os seus. Um sentimento de casta que montou no dorso dos humildes que rabeiam na cauda da humildade, educados para a necessária genuflexão aos sábios. E se os sábios forem impostores, protegidos pelo sentimento de casta sem terem de provar o que valem a um júri imparcial? E se os sábios o forem porque assim se decretam uns aos outros?
Talvez, então, se provasse a toxicidade do ego aspergida por tempo tanto. E os notáveis se dissolvessem nas cinzas dos egos. Pois só os quem têm fraca raça se blindam num ego febril e fabricado.

1 comentário:

Museu Nacional de Soares dos Reis disse...

Para os referidos "egos de fraca raça"

Adivinha

"Não é galo nem galão,
nem padre nem sacristão;
é um animal esquisito,
entre o peru e o pavão,
tem barbas ruivas de milho,
tem olhos de crocodilo,
rabo de rato, ou de cão,
ão, ão, ão ! "

in:“Aquela nuvem e outras”, Eugénio de Andrade