10.3.14

Divindades, só femininas

dEUS, "Eternal Woman", in http://www.youtube.com/watch?v=Horl9gLzs_c
(Dia internacional da mulher, dois dias de atraso)
Um ateu não acredita em deus. Podia repensar a dúvida metódica (convertida em certeza contrafactual: pois deus não se vê) se jurassem, com científica certeza categórica, que as divindades são as mulheres. Todas. As mulheres boas e as mulheres más. Novas e idosas. Sem olhar a credos e raças. Ou à estética nem à ética, ou às respetivas ausências.
Deusas são as mulheres, contra os escritores misóginos que trataram de as depreciar em páginas corridas que são confissão de impotência pessoal destes agiotas da masculinidade. São mães, amigas, companheiras, ou apenas mulheres que passam na rua na indiferença do bulício citadino. Geram-nos. Amamentam-nos. Acarinham-nos como mais ninguém o consegue, mercê dos laços filiais, comunhão de carne e sangue. São amigas. E companheiras, outra carnalidade, diferente. Nelas fervilha uma sensibilidade à parte. Uma intuição que desponta a inveja masculina. É falaz dizer-se que são o sexo fraco: a elas assiste uma força motriz que não tem par. São um oráculo onde se depositam os afetos. O seu riso aberto é uma janela que se abre, ampla, ao ar fresco guardado no exterior. A pele suave, desconhecida no sexo masculino, é convite ao desvelo. Os cuidados nos arranjos (que tropeçam na artificialidade se forem excessivos) não são caso de frivolidade; são expressão de uma sensibilidade inata que os homens admiram e, nem que seja por silêncios cúmplices, encorajam.
A mulher é um esteio onde se escora um homem. A casa sagrada onde se dividem segredos. Um ouvido lúcido e adestrado para os conselhos avisados em maré de tempestade. Portadora de uma fibra singular que adultera as convenções (afinal elas são o sexo forte). Os homens mantêm uma relação ambígua com as mulheres, sequestrados num mar de contradições. Invejam-nas e desdenham delas. Querem-nas em toda a sua volúpia e confessam que as coisificam amiúde, para logo a seguir sobre elas deitarem o opróbrio da complexidade inútil. Sem darem conta, prestam-lhes a maior homenagem: pois elas são armadoras de desejos, deixando que o reputado “sexo forte” se enrede em fragilidades irremediáveis. Só quem se vê imerso em sua imensa fraqueza é que ostenta, com boçalidade marialva, que é o sexo forte.
Essas proclamações, e aqueles varões que se embebem no convencimento da masculina superioridade, são a silenciosa demonstração de todo o seu contrário: fortes são as mulheres; e deusas, por tanto aturarem o pedantismo varonil, são também as mulheres.

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