13.8.14

Sobre a têmpera dos ventos que sopram pela alvorada

A alvorada veio na companhia de ventos que não tiveram convite. Sopraram e voltaram a fugir. Podiam ser ventos piratas, timoneiros de uma desbonança qualquer, só para roubarem o sono aos que o têm frágil. Os ventos quiseram anunciar a alvorada, talvez a despropósito pois o sono ainda tinha pernas para andar. Mas os ventos piratas não se importaram. Deram o braço à alvorada e começaram a soprar entre as frinchas das janelas, assobiando uma melodia timorata que afugentou o sono para outros quadrantes. Talvez fossem ventos nómadas, como se fossem gaiatos estarolas decididos a espalhar o caos pelas ruas antes de desatarem a fugir. O sono frágil estava de atalaia. Estatelou-se no despenhadeiro dos ventos que soaram a bombarda mal a madrugada tocou de finados. O sono sentenciou, importunado, que tais eram ventos desassisados. Podiam esperar um par de horas e já não seriam impródigos. Mas os ventos não se importaram (outra vez). Parecia que queriam sobressaltar o sono, de propósito. Gatunos da serenidade, espalharam a poeira nas ruas e souberam roubar os sonhos que ainda se teciam por entre as fímbrias do sono. Os olhos vieram à janela para ver se conseguiam ver o rosto do vento. Mas o vento era contumaz. Nem dava para perceber de onde soprava. As árvores balançavam sem norte, de um lado para o outro, pautadas pelo desnorte aleatório das bofetadas que levavam do vento. O sol começava a despontar, testemunhando as aleivosias do vento. Mas o sol, de que se diz ser rei entre os astros e alicerce do universo, ainda estava a espreguiçar. Não deu atenção ao vento falaz que desarrumou o sono. O sol estava ocupado a fazer o seu caminho ascendente no firmamento. Deixou o vento como estava. E eis como os ventos piratas celebraram dois triunfos. Sobre o sol rei. E sobre o sono frágil de quem o tem.

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