14.1.15

Decálogo do homem bom

The Heavy, "What Makes a Good Man", in https://www.youtube.com/watch?v=08h0IVs4RKQ
1. Da bondade intrínseca.
Não é preciso invocar mandamentos bíblicos. Sobra a vontade em refrigério interior. A peregrinação trará os sedimentos da bondade. Mesmo que ela já exista.
2. Da não cobiça.
O que aos outros vem, a eles pertence. Não é matéria apropriável. Um qualquer desígnio escolhe a paleta de cores que enfeita o olhar. Não adianta cobiçar o que é linhagem alheia.
3. Da intensidade dos sentimentos.
Só merecem aplauso os sentimentos que vêm das entranhas, os que são possuídos pela inteireza. Mapa-mundo que cartografa as linhas das mãos e ensina a dedilhar as páginas que destravam o tempo (ainda) ausente.
4. Da decência (de braço dado com a bondade intrínseca).
Uma espécie de cavalheirismo sem os maneirismos dandy, ou preconceitos que são a raiz quadrada de pergaminhos afetados. Se a decência for ciciada em maneirismos dandy ou preconceitos afetados, não é decência: é decadência.
5. Da generosidade não cínica.
Fazer bem ao outro também não é exclusivo dos mandamentos bíblicos. É inato. Desde que seja descomprometido. Não é que o cinismo seja método censurável. A objetivação das coisas, os parâmetros que se afivelam em imperativos categóricos, esses é que são imagens nauseabundas. Que se lhes responda com cinismo.
6. Da repulsa da sabedoria categórica.
Há poucos categóricos: o não à sabedoria monolítica, àquela que se consome na estreiteza dos seus quadros mentais tão apertados, é negativa categórica que se tolera. Dos eruditos que parecem onanistas em sua própria erudição não merece a atenção ser consumida com tempo desperdiçado.
7. Da não religiosidade (como passaporte para a intensidade dos sentimentos).
Por causa da liberdade. Não merece a integridade do ser ficar refém de credos ou preces ou catecismos ou entidades divinas que prometem a fragilidade dos crentes – no fim, a sua irrelevância. Somos inteiros, universos complexos cheios de virtudes e de fraquezas. Rivalizamos com as divindades. Desafiamo-las a serem a sua negação.
8. Da negação dos pecados (ou acerca da sua prática).
Ainda por causa da liberdade: não deixemos as peias aplacar a vontade. Se o que resulta da vontade leva com o opróbrio do pecado, o mal é de quem assina tamanha sentença. No limite, prefira-se o pecado à imorredoira penitência ditada por juízes de comportamentos alheios.
9. Do despontar de uma nova aurora (ou do encerramento de janelas datadas).
Repudiem-se os conservadorismos, atávicos cárceres que tutelam a vontade e a refreiam. A demanda de novas alvoradas é critério melhor.
10. Da negação do que for preciso ser negado.
Se for a medida para sepultar os que se entregam a missões de educação dos outros. Da negação metódica, portanto. Mau feitio, apenas; ou negação espontânea, ditada pela vontade genuína de dizer não aos que querem agrilhoar vontades que suas não são.

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