6.8.15

O mantra da independência

Tame Impala, “’Cause I’m a Man”, in https://www.youtube.com/watch?v=hefh9dFnChY
Podemos sempre olhar pelo diadema da relatividade e aceitar que outros valores, noutras alturas e noutras circunstâncias, aferem-se prioritários; nesta altura, o que vem de dentro é a impressão – diria, o orgulho – que um desses bens maiores é a independência.
A independência de ser, de pensar, de atuar, de estar perante o mundo e os outros. Porque não há maior carta de alforria do que a capacidade para se ser como se quer ser, sem sentir as mãos algemadas por condições impostas de fora. Sentindo que não há quem consiga ser intruso na forma de ser, no pensamento não amestrado, nas palavras proferidas, nas ações feitas. Pode até haver quem ache que é diligente nesta intrusiva simbiose de sentido único; coisa diferente é postular o sucesso a que tal gente não está fadada ao projetar tamanho propósito. Vêm bater à porta errada.
A possibilidade de haver quem infrinja as fronteiras da independência que correspondem aos limites do outro materializa uma condição prática que desmente preceitos que fruiriam de teorias. O tempo moderno pode ser o da consagração da autonomia do ser. É a lição das teorias. Mas há um descaminho entre os princípios e a prática, quando esbarramos em gente que faz tábua rasa daqueles princípios. Ou porque têm deles uma interpretação distorcida, ou porque não há nos seus genes o respeito por tais princípios. É gente infame, que nem sequer consegue perceber a desdita da reciprocidade. Ou como podem as coisas sofrer uma reversão e sobre aquela infame gente se abater a infâmia de que quiseram ser fautores sobre outros. Quando alguém exorbita a sua autonomia e invade a autonomia do outro, é-lhe dado a imaginar como se sentiria se o processo tivesse sentido inverso?
Porventura, exibições de poder, ou apenas uma predisposição genética, são o substrato do autismo de quem invade a independência dos outros, querendo-os, ao invés, dependentes. Correndo o risco do excesso retórico, dir-se-ia tratar de uma reconfiguração moderna da escravatura.
Não caio na ávida tentação de desejar a gente deste jaez o mesmo que querem aos demais. Eles merecem a mesma independência que para mim é princípio supremo.

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