30.9.15

No dorso da melancolia

Einstürzende Neubauten, “Melancholia”, in https://www.youtube.com/watch?v=y0G9h1SYaso
A melancolia tem uma crina viscosa. As mãos agarram-se à crina, não vão os solavancos da montada atirar o corpo ao chão. Mas a crina, admirável ao observador exterior por parecer sedosa e bem tratada, emprenha-se nas mãos, tomam-nas num todo seboso.
Já se devia ter aprendido. Não tem proveito soçobrar nas águas lodosas da melancolia. Não deviam importar as cismas que sobem das veias ao púlpito dos sentimentos. Parece que só se aprende a desaprender. Parece que a melancolia indomável, cárcere lúgubre onde os olhos não encontram um módico de luminosidade, produz uma atração irrefreável. Os autos atiram a pessoa contra a parede onde se autoflagela. E o que se retira da flagelação? Coisa nenhuma. A não ser o desaprender do que se julgava aprendido. Por mais que os solavancos da montada alinhem o chão irregular, império das pedras pontiagudas onde é tão fácil abrir ferida, aquele não é lugar para tirar as medidas à autoestima ausente. Sem perceber de onde vem esse manancial. Oxalá houvesse uma medida meã entre os que ostentam presunçoso garbo e os que medram no convencimento de que todos os males habitam em si.
Enquanto o corpo subiu ao dorso da melancolia, é como se tudo lá fora entrasse em hibernação. Se calhar, as coisas têm de ser medidas pelo seu avesso: e enquanto cavalgar no dorso da melancolia, o cavaleiro aprisionado a um estigma que o apouca, que o faz apoucar a si mesmo, amordaça-se à hibernação. Podem ser cicatrizes que embaciam o olhar. Podem ser interrupções na lucidez, atirando-o para o fundo de um poço de onde não vê sobras de luz. Pode ser o convencimento de que é má rês. Ou apenas o embaraço de se convencer que é um biltre, que dele não se aproveita nada, nem a carcaça velha quando finar.
Pelas fímbrias da luz que ecoa entre as persianas, parece que é noite. A penumbra açambarcou o sono, timorato e em inútil demanda. Os olhos abertos, consumidos pela insónia, fixam-se nas sombras dos poucos carros que entrecortam a luz dos candeeiros. Sucedem-se as perguntas. Sucedem-se as hipóteses de incapacidade. À banda da noite madraça, a melancolia enche os olhos de lágrimas. Que choram.

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