27.10.15

Por que deve a moral estar fora da filosofia

Pop Dell’Arte, “Ritual Transdisco”, in https://www.youtube.com/watch?v=sDh4e3TjUjU
(Depois de “O homem irracional”, de Woody Allen)
Um professor de filosofia, conceituado e polémico entre os pares, ensina filosofia num curso de verão. Disserta sobre os filósofos que teorizaram sobre moral. Desafia os alunos a desafiarem os cânones sobre a filosofia da moral. Os questionamentos sobre a moral são um imperativo. As respostas não devem saciar a sede de outras interrogações. Um lugar determinado na filosofia da moral não pode ser um achado, imutável como são os achados quando quem os achou os toma como proezas. O professor dá exemplos, desafia os alunos com outros questionamentos que os levem a sopesar o seu lugar perante a moral filosofada – seja através de Kant, Leibniz, Kierkegaard, Husserl ou Sartre.
Na reviravolta do enredo, o entediado professor descobre que só consegue ser pessoa em sentido pleno se assassinar um juiz. O juiz havia tomado tantas decisões injustas que penalizaram uma pobre mulher a quem o juiz tirou a guarda dos filhos num divórcio. Citando Sartre (“o inferno são os outros”), parte à redescoberta de si através do plano magistral de um assassinato pensado para não deixar pontas soltas. A jovem musa que se enamorou por ele descobre as pontas soltas. Confronta-o. O professor terá de se entregar à polícia – mais a mais, a polícia prendera um suspeito inocente. O professor não conseguiu antecipar o cárcere e a privação da liberdade. Passou por cima do exemplo que, em jeito de desafio, fez a um aluno a propósito do imperativo categórico kantiano: “se escondesses a família de Anne Frank e a polícia nazi entrasse em tua casa, dirias que os fugitivos estavam escondidos no sótão, só porque a moral kantiana a isso te obrigava?
O professor teria razão numa coisa: os calhamaços que tresandam a filosofia são apenas palavras abundantes, teorizações complexas, sofisticadas, elegantes, mas sem sentido prático. A filosofia não se aplica à vida real. Como se acabaria de confirmar pela agonia que o desafiou, mas que ele olimpicamente ignorou. Fazendo lembrar um adágio popular: “no melhor pano cai a nódoa”. Pois não era ofício do professor ensinar os meandros da moral (teorizada pelo ângulo da filosofia) aos espíritos curiosamente jovens e, à primeira curva traiçoeira, acabou atado na contradição dos ensinamentos com o imperativo do seu bem-estar?
Talvez preço a pagar pela reabilitação para a vida e correspetivos prazeres, o professor supôs que talvez fosse melhor não ser julgado pelos atos, mas pelas palavras ditas do alto da cátedra. Tenho para mim o que sempre julguei assisado: a moral, fora das fronteiras da filosofia. Ou então a filosofia limitada a uma prescrição minimalista, pois a moral não se objetiva, devolvendo-a ao mando do subjetivismo.
E não, a filosofia não é um farol esotérico desligado da paisagem real. Longa vida à filosofia!

Sem comentários: