4.11.15

O dandy de Paris

The Dandy Warhols, “Bohemian Like You”, in https://www.youtube.com/watch?v=CU3mc0yvRNk
Garboso, mas indiferente ao movimento à sua volta. E eram tantos os turistas em Les Invalides que queriam ir à esplanada natural sobre a Torre Eiffel que, apesar da vontade irrefreável do ícone da cidade, não ficavam (eles sim) indiferentes à personagem fidalga. O dandy de Paris fazia uma pausa a meio da tarde sentado na escadaria diante do museu, o sol já outonal (mas com ares de fim de verão) invadindo-lhe o rosto que já alojava as rugas em denúncia da idade. Dir-se-ia que o homem tinha acabado de entrar na sexagenária idade.
Tirando as rugas, só se discernia a ousadia de um dandy. A elegância da indumentária, a roupa impecavelmente passada a ferro, sem vincos fora do sítio ou rugas (que estavam reservadas para o rosto). O dandy ostentava um colete debaixo do fato que era chamariz para os turistas que iam com a atenção burilada para a torre Eiffel: o colete em padrão galês, com a mistura de cores garridas a contrastar com o cinzento escuro do fato. Uma gravata em tons dourados combinava com as peúgas vermelhas, num detalhe não despiciendo que emprestava lustro à combinação do clássico com o ousado. Ainda por cima, o dandy arregaçou as calças quase até aos joelhos, deixando à mostra as luxuriantes peúgas. A preceito, os óculos com farta armação de massa mostravam-se no vermelho que era fio de prumo do contraste de estilos. Um dandy é isto: a fusão de elementos que vêm de modas diferentes; o desassombro intelectual penhor da aliança de movimentos que, dir-se-ia, estão nos antípodas. Onde, se não num dandy (e logo em Paris), seria possível a fusão de contrastes? Um lord inglês apressar-se-ia a vociferar contra a heresia.
Não por acaso, o dandy parisiense lia Husserl enquanto se comprazia com o sol quente que o outono avisava ser derradeiro. O dandy parisiense, jactante e excêntrico, com traços britânicos em osmose com singularidades italianas, esticava os limites da extravagância e consumia os rudimentos da fenomenologia.
E eu perguntei aos meandros do pensamento se a fenomenologia não quadra com os dandy (mas só aqueles que sabem que existe a filosofia). Ou, visto por outro ângulo de análise, como o dandy parisiense podia ser a essência da fenomenologia.

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