13.9.16

Prima facie

The Durutti Column, “Messidor”, in https://www.youtube.com/watch?v=gNp-M8tDt5M
A rua, na manhã depois de um fim de semana, na manhã que inaugura o ano escolar. Gente agitada com rostos impassíveis. Gente meio adormecida, rostos acabados de sair da hibernação. Gente apressada, rostos alarmados e passo acelerado. Automóveis parados na fila para o semáforo. Automóveis que procuram estacionamento junto ao portão da escola, sem se importarem, os respetivos donos, com as buzinas de condutores impacientes que protestam.
Adolescentes que recomeçam a escola. Estranhamente, rostos sorridentes em contraste com os rostos fechados dos adultos que começam, contrariados, mais uma semana de trabalho. Dir-se-ia que os adolescentes se fartaram das férias. Ou que estão ansiosos por voltar a conviver com os colegas da escola. Ou, talvez, se vão conhecer gente nova. Não sei se se poderia assegurar que os rostos sorridentes, e o ar em geral fresco que ostentam, seriam correspondentes ao sentimento de contentamento de quem vai em busca de saberes.
Na mesa do café, um pai ensina à filha os segredos de uma máquina de calcular que, olhando ao tamanho da máquina e ao aparato do teclado, seria uma máquina de calcular técnica, sofisticada. Se calhar, o pai é engenheiro de uma coisa qualquer e deixou em herança antes do tempo uma máquina de calcular que usara em tempos, entretanto substituída por um gadget com tecnologia mais avançada. O pai adverte a menina que há duas teclas que, devido ao uso, precisam de cuidado no manuseamento.
A rua lá fora continua agitada. É da hora. E do primeiro dia em que toda a gente, em conjunto, disse adeus ao período estival. As pessoas estão com pressa para terem a rotina de volta. A crer no que os rostos sinalizam, são reféns de um paradoxo: apressadas para saírem da rua agitada, com urgência em voltarem ao trabalho – como quem precisa do trabalho como se fosse o seu oxigénio; mas, ao mesmo tempo, de rostos fechados, soturnos, entristecidos, cansados antes do tempo, rostos de quem mostra que preferia a caução da inatividade. Não sabendo por quantos rostos passam, a esta matinal hora em pleno bulício, de gente desocupada que ostenta os mesmos rostos fechados, soturnos, entristecidos e cansados antes do tempo, por não terem função a preceito.
Quantos dos rostos adolescentes que contrastam com os rostos adultos contemporâneos mudarão de feição quando o futuro tiver lugar no calendário, depois de eles deixarem de ser estudantes?

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