25.1.17

Deixemos que seja a vez dos violinos


Sigur Rós, “Starálfur”, in https://www.youtube.com/watch?v=SQuki_8COXs    
Não deixemos a voz troar, impenitente. Não deixemos que a jugular seja consumida por um silêncio sufocante. Não deixemos palavras rufias em dilaceração das estrofes que empresta cor o céu. Não queremos que as paredes se embotem, substituindo as flores que esperam pela sua vez de medrar.
Talvez seja oportuno arranjar paredes caiadas, ou então que partamos em demanda de paredes que possamos caiar com as nossas mãos sedentas. O entardecer não é um sinal de decadência; o entardecer, mesmo que não seja enfeitado pelo ocaso de um sol desnatado, é uma janela polissémica de oportunidades. Esperamos pelos sons a propósito. Pelos sons que não sejam um freio sobre os mais nobres propósitos, enquanto damos as mãos e elas se entretecem na raiz quadrada do desejo. Talvez sejamos porta-vozes de um segredo e, por isso, deixamo-lo em total fruição por dentro de nós. Congeminamos os violinos em redor; descobrimo-los, mesmo que ao primeiro solfejo do vento eles não venham a preceito. Pois aprendemos a não capitular. Aprendemos a ser tutores do nosso fado, tangendo as cordas dos violinos inventados, compondo música mesmo sem sabermos compor música.
Do mais imponente edifício que habitamos, nossa sede futuramente tumular, deitamos o olhar por fora da janela. Aprendemos a sentir as veias do vento gritado pelo mar e juntamos as mãos que se fecham, arqueadas sobre este nutriente. Não olhamos por dentro dos pesares. Não estimamos os vultos que espreitam sobre a arcada do tempo. Atiramos uma pedra pequena, que se deita sobre o mar. Metemos os pés na água e sabemos que o perfume das ondas investe contra a pele carente, arrancando-lhe as rugas.
O ciciar do mar é o único som que ouvimos na solidão noturna que é o palco que pisamos. O rumorejo das ondas é o baraço que prende as cordas de violinos extasiados que habitam os nossos ouvidos. Só nós os escutamos. Só nós somos tutores de uma alfândega-fortaleza, que fechamos ao exterior. Mandamos o mundo saciar-se noutras paragens. Mas somos generosos: mandamos dizer ao mundo exterior que há muitos violinos por descobrir.

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