6.10.10

Os egrégios avós e coisa e tal


In http://www.online.adm.br/ejotape/bancoimagens/03CAVALETE_PISO_ESCORREGADIO19.JPG
Pelos olhos passavam as imagens muito solenes da festarola do centenário da portanto vetusta república. Talvez não estivesse embevecido como seria exigível a um cidadão exemplar (que definitivamente não sou). Os discursos de circunstância e as reacções dos líderes dos partidos, também de circunstância. Uma peça de teatro pelo meio das ruas e da populaça que veio celebrar a república centenária. Uma barítona (ou seria tenor?) a entoar o hino com pulmões abertos e uma exaltação que arrepiava.
Os acordes do hino sucediam-se e as câmaras filmavam os notáveis nas filas da frente, todos eles, sem excepção, debitando as estrofes do hino. Outras câmaras situadas mais atrás passeavam pelo meio da gente anónima que veio homenagear a república. Também entoavam o hino, entre o fervor (como o guarda-redes da selecção nacional, que não canta, grita o hino) e a relativa indiferença. Foi quando cheguei à estrofe que faz alusão aos “egrégios avós”. E interroguei-me: quantos, entre notáveis menos instruídos e a populaça ali presente, saberiam o significado de “egrégio”?
Daqui confesso a minha ignorância – também engrossava o grupo dos que não sabiam o significado da palavra. Fui perguntar ao dicionário: “egrégio” traduz “ilustre”, “distinto”, “nobre”. Para já, nem vou à arquitectura das palavras, se elas assim compostas fazem algum sentido quando os cânones da boa cidadania mandam que cantemos, de preferência com exaltação, o pátrio hino. Para já, é isto: como é impressionante que certas palavras sejam metidas na cabeça à martelada e depois entoadas repetidamente sem que as pessoas sequer saibam o seu significado. Como se conseguem arrepiar sem saberem do que estão a falar (no caso, a cantar).
Dir-me-ão que o hino não é para ser levado à letra, que é um símbolo que cimenta um sentimento de pertença. Não se exige que as pessoas saibam o significado das palavras menos acessíveis que aparecem nas estrofes, ou que pretendam activar a literalidade do hino. Ou seja, também há no hino algo de religioso. As pessoas cantam-no como muitas delas (as católicas) rezam o “pai nosso que estais no céu”, desfolhando maquinalmente as estrofes sem cuidarem do seu significado.
Se nos deitássemos no hino, se fôssemos cultores da sua hermenêutica, chegávamos a esta conclusão: o hino não retrata esta terra, estamos a precisar de fazer o funeral deste hino que canta uma terra que já não coincide com as fortes imagens trazidas pela mão das estrofes. Podemos ser um “nobre povo” (dou de barato, apesar do pessimismo antropológico), mas como seremos capazes de “levantar o esplendor de Portugal”? São tão poucos os iludidos com a grandeza de outrora que é descabido que nos consideremos “uma nação imortal”. O hino, qual oráculo imaginado, pressagia que o distante rumor dos “egrégios avós” nos há-de “guiar à vitória”, um dia qualquer, tão incerto como as “brumas da memória”. E o que é a “vitória” nos dias em que vivemos?
As últimas seis estrofes são um anacronismo pegado. Se o militarismo pertence ao passado (já foi o tempo do serviço militar obrigatório), quem ia “às armas” com o propósito de “pela pátria lutar”? E quem, no seu juízo, dava o peito para marchar “contra os canhões” (ou os seus modernos e muito mais letais sucedâneos)?
Este hino é uma ímpar risota. É um encanto ver a populaça que canta com exaltação o hino, desprovida de sentido crítico. 

14 comentários:

  1. Desfolhando?? Grande moral... Folheando ó urso.. Q merda de texto.. E para de repetir "para já "

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  2. Caro anónimo: sempre que lhe apetecer uma dose de merda, passe por cá. Sou muito generoso com as necessidades dos outros!

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  3. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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  4. deixe que lhe diga que sim o hino é para ser entendido sim! mas não para ser gozado como você fez questão de fazer durante este texto. é óbvio que o texto ao ter muitos anos é normal que não é para ser levado à letra em alguns casos, mas sim tirar o sentido que este representa! quando se canta "Pela Pátria lutar" não é só de forma militar mas sim dar sempre o nosso melhor para engrandecer o nome de Portugal. e o sr por acaso nunca estudou poesia?! sabe é que as vezes é necessário subentender coisas que não estão lá, sim porque o hino é uma poesia e não uma prosa.
    cumprimentos,
    Susana Graça

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  5. pena é que não lhe tivessem ensinado o significado das palavras quando tinha 6 anos... já não seria entoado o Hino tantas vezes na ignorância... mas mais vale tarde do que nunca. Também poderá mais tarde chegar à conclusão que as suas ideias são completamente desprovidas de patriotismo o que é lamentável.

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  6. cara podre Susana

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  7. Estou completamente de acordo com a Susana. Que pobres de espírito os que dizem mal do nosso querido hino que é, por mais que não queiram IMORTAL e sempre será IMORTAL.

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  8. Imortal? Uma brincadeira pueril de uns foleirecos do séx XIX não?

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  9. Caro "amigo",

    A ignorância não se discute, lamenta-se! É verdade que neste nosso pequeno (grande!) país existe, ainda (e infelizmente), um elevado grau de analfabetismo... Mas existe, também, um fácil acesso a veículos de informação! O uso que cada um (incluíndo o senhor) faz deles... enfim...

    Respeite-se(!!) começando por respeitar os outros e a "Nossa" língua ímpar e riquíssima, o Português!

    João Nuno Romão

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  10. Caro João Nuno Romão:
    Muito obrigado pelo elogio.
    Ainda bem que, como eu, preza a liberdade de expressão.
    Cumprimentos.

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  11. Pior, só o facto de seres professor e entenderes a educação como descreves no texto...preocupante para cada pai ou mãe cujas crianças te passam pela frente.

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  12. Caro(a) anónimo(a) de há uns vinte minutos: muito agradecido pelas simpáticas palavras. Sinto-me sempre tocado por um elogio.

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  13. Carlos caldeira27 agosto, 2016 11:49

    Caro PVM, há de concordar que é difícil ter um hino à la carte para cada época histórica do nosso povo. Se assim fosse, onde iria parar a nossa identidade como país? O texto do nosso hino (A Portuguesa de seu nome) deve ser interpretado com polissemia, não traduzindo à letra a sua mensagem. O mesmo deve ser assimilado e respeitado como um dos símbolos de Portugal e das suas gentes, um fator de unidade e um fio condutor entre passado, presente e futuro que tem funcionado, a meu ver, perfeitamente.

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  14. Caríssimo amigo, trabalho com uma família portuguesa aqui no Brasil que sente orgulho ao cantar o hino de Portugal, tanto que as vezes me pego cantando também o hino da minha segunda pátria. Mas, se fosse seguir o seu pensamento aqui exposto, deveríamos mudar também o hino brasileiro em muitas estrofes. Como já foi dito, o hino nos faz lembrar do passado, presente, a esperança de um futuro melhor. Que sentimento melhor que o patriotismo? Abraços

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