15.12.25

LIII

Nine Inch Nails, “The Great Below”, in https://www.youtube.com/watch?v=HuzlnauEVw8

“The half-moon is aching, bitter and sad.”

O tiranete pequenino, acocorado sobre os cotovelos, lê um manuscrito onde verteu a derradeira peça da doutrina obrigatória que os cidadãos pela metade têm de respeitar. O tiranete, acocorado sobre o seu pensamento escaninho, devora o ressentimento por grande parte dos outros lugares não se rever no seu pensamento. A pose sobranceira, os gestos que dão cor às palavras ameaçadoras, o olhar vítreo, de alguém que não se consegue comover com o que quer que seja, enfeitam a personagem daninha que sequestra as liberdades por todo lado.

Os tiranetes, por maior que seja a ambição de se tornarem imperadores, nunca deixam de ser homens pequeninos. Homenzinhos, se os preceitos do rigor forem convocados. Talvez por não saberem conviver com o espelho, que aos seus olhos devolve um nanismo confrangedor, colam-se ao poder da força, à força dos arsenais, e sitiam o resto do mundo com o medo dessa força beligerante. Por saberem que conseguem ter refém o resto do mundo, opera-se um milagre com a intermediação do espelho feito à medida: a imagem devolvida pelo espelho é de um homem grande, corpulento, um homem que tem a batuta do mundo entre os dedos e marca o ritmo da dança dos outros. Um homenzarrão que faz tiritar de medo todos os que não pensam em coro com ele.

Ao deitar, esses homens pequeninos tomam o ansiolítico do poder do mundo que se deita nas suas mãos. É uma droga viciante. Se não se deitassem convencidos do seu poder incomensurável, as insónias devolveriam o estigma da baixa estatura que neles funciona como uma metáfora devastadora. O simplismo do raciocínio pega-se ao comportamento. Tudo se reduz a categorias binárias. Os que não estão do seu lado figuram nas trincheiras do inimigo.

Faz parte do seu nanismo interno condenar aqueles que deles discordam à privação das liberdades, na pior das hipóteses à morte mal encenada em suicídios que não passam de uma farsa. A imagem do tiranete do momento, curvado sobre os cotovelos, fingindo que, na sua condição septuagenária, dispensa óculos para ler o papelinho à sua frente, monocordicamente debitando as suas verdades irrefutáveis, é a imagem de um homenzinho poderoso que se extingue na extremidade do poder de quem mantém sequestrados os que coabitam nos antípodas. É a imagem da maldade na sua descrição perfeita.

Se houvesse outro mundo após a morte, estes homenzinhos seriam condenados ao anonimato, vegetando na indiferença de quem é metaforicamente pequenino e vive sufocado pela inviabilidade de ser alguém na vida. O homenzinho acocorado sobre os cotovelos, fazendo uma corcunda significativa, com o olhar gélido deitado sobre a folha de papel onde está debitada a derradeira peça de propaganda hostil, é a imagem de um grande urso todavia decadente, esperançosamente sem descendência, já que os delfins que se encontram na linha de sucessão são ainda menores do que ele, e por isso encena, com a espetacularidade dos que precisam de um fingimento inteiro, a pose do tiranete soez que só teria descanso se o mundo inteiro se convertesse ao que apregoa. 

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