11.11.25

XXIX

Rosalía ft. Björk and Yves Tumor, “Berghain”, in https://www.youtube.com/watch?v=htQBS2Ikz6c

“Let’s go out for a walk”.

Ao domingo, as pessoas gostam de sair de casa. Fazem o (convencionado) “passeio dos tristes”. Metem-se nos carros e encetam as suas procissões vagarosas pelas estradas frequentadas por outras pessoas que também vão no seu “passeio dos tristes”. Convergem nos mesmos locais, não por acaso atirados para as convenções dos pontos turísticos da região. Parece que todos fogem das casas que são, contudo, pouco frequentadas durante a semana.

Mesmo que esteja um tempo outonal, quase a escorregar para a invernia que não tarda, famílias inteiras saem de casa e encaixam-se no espaço exíguo dos carros. Este é o passatempo da tarde inteira. Serão menos a visitar a gelataria quando os filhos entrarem na adolescência e deixarem de ter paciência para aturar os pais nas procissões familiares escrupulosamente dominicais. 

Ainda ouvem o relato enquanto passeiam o seu vagar nas estradas regionais. Quando os filhos forem adolescentes, deixarão de frequentar a gelataria – assim como assim, só iam à gelataria porque os petizes queriam lanchar as iguarias americanas que só aquela gelataria confeciona. A meio da tarde, o pai e a mãe dos adolescentes rebeldes estacionam diante do mar, num dos lugares que ainda estiver vago, e o marido adormece apesar da voz esganiçada do narrador do jogo de futebol que vai transformando um jogo maçador num acontecimento que entusiasma os ouvintes.

(As rádios locais têm de sobreviver.)

De regresso a casa, a consorte vai remoendo em antecipação a semana que a espera. As lides da casa: a escolha da ementa para o jantar, a roupa dos filhos, a roupa do marido (que ele não tem jeito para se apessoar), as limpezas da casa; não pode deixar os créditos por mãos alheias, e a sogra, quando vai de visita lá a casa, está constantemente de atalaia à espera do mínimo deslize na limpeza da casa, na roupa do marido e dos “meninos”, na qualidade do almoço de todos os sábados. Ainda é domingo e já está a desejar que volte a ser domingo outra vez. O regresso a casa torna o estertor do domingo uma tortura. Já prometeu que deixaria de antecipar os dias da semana, para não trair a serventia do domingo. Ainda não conseguiu.

As tardes de domingo são um hino ao silêncio. Têm poucos assuntos para falar. Os assuntos da sua preferência são indiferentes para ela. Nunca gostou de futebol e agora ainda menos. Os assuntos que correspondem a uma vaga atenção dela são “coisas de mulheres”, como ele descreve em tom jocoso. Ela já não se lembra há quanto tempo ele a beijou na boca ao acordar. Ele envelheceu antes do tempo, à boleia de todos os amigos que também envelheceram antes do tempo e se dedicam a coisas frívolas que, todavia, também preenchem as vidas.

Ao domingo, têm de continuar a sair de casa e a queimar dinheiro no gasóleo queimado durante os quilómetros do “passeio dos tristes”. A solidão silenciosa da casa de morada de família é ainda mais triste.

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