The White Stripes, “Dead Leaves and the Dirty Ground” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=Ziuu93gFaGg
A barriga encolhida – era preciso parecer bem antes de cair a máscara e tudo não passar de um fingimento. Mas se fosse às funduras do pensamento, naquele lugar remoto onde as mãos varrem do fundo todos os vestígios que podem importar, desatando as interrogações consecutivas, perguntar-se-ia: por que é tão importante fazer de conta? E fazer de conta por causa de baias estéticas que ganharam foros de ordenança?
É como a lagartixa que procura ser jacaré. Pode-o ser através de um jogo de sombras. Projeta o corpo numa parede com a ajuda da luz situada na sua retaguarda. A luz amplia o tamanho do corpo. A semelhança genética cuida do resto: por um ato de magia, a lagartixa superou a pequenez e conseguiu parecer um jacaré (pelo menos enquanto durou a luz projetada na parede). Esta seria a altura para a intervenção de um guru da almas, para chamar a si os créditos pelo exercício intelectual que é fazer das fraquezas forças. E o guru ficaria em palco, gongórico e desinteressante, a escorrer logros, enquanto não fosse deposto por um filantropo qualquer que lhe dissesse: não foi por magia, foi por um jogo de sombras que a lagartixa se transfigurou jacaré.
O fingimento é um atestado de desagravo. Um desagravo virado do avesso, para o interior do sujeito. É possível encontrar um atalho que magnifica o sujeito. Tem pendências interiores mal resolvidas, ou ainda por resolver. Corteja um eu que não é, como se um modesto país teimassem em ser uma França qualquer. Ainda por cima, fazer conta que é a França passa ao lado do que é importante: quem assim se comporta ficou parado no tempo, a França já não é potência há sete décadas.
Em vez das convenções que ensinam os parâmetros aceitáveis, ultrapassando a ignomínia do “novo Homem novo” para congeminar um pós-novo Homem novo que depressa terá sequelas intermináveis, quem é Lichtenstein não devia ambicionar ser França. Somos escrutinados pelos olhares dos outros. Querer ser alguém que transborda os limites do sujeito é um devaneio risível. Os outros perguntarão: para que queres ser França se a França deixou de ser o que foi?
Essa seria uma pergunta suicida. Circunda o que importa e ajuda à interminável procissão de fingimentos que é o cimento das pertenças.
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