Metronomy, “The Bay”, in https://www.youtube.com/watch?v=9PnOG67flRA
Tirando os cegos, ninguém conseguia descobrir a república da felicidade.
Uns, sombrios, não acreditavam que pudessem ser cercados pelo arco-íris da felicidade; era um conceito estranho, externo, uma impossibilidade concreta. Outros eram indiferentes, estavam convencidos que a felicidade era contingente e eram tantas as variáveis que a tornavam um domínio do acaso.
Havia aqueles que perseveravam: sabiam conjugar a felicidade e, mesmo sabendo que era entrecortada com a sua antítese e com outros momentos de neutralidade, era sazonal, mas irregular. Estes podiam ser inventariados como testemunhas abonatórias da felicidade. Se estivessem na posse de todas as faculdades e não fossem atraiçoados por um juízo que acabaria por ser um logro.
Ainda havia aqueles que celebravam a felicidade no estrito domínio pessoal, levantado uma cortina de ferro para não misturarem o mau andamento do mundo, um princípio geral de que não abdicavam, com o domínio pessoal. Refugiavam-se na soberania do amor, na fortaleza da família mais chegada e nos afetos afins, embainhando uma coutada fechada ao exterior. Viviam numa república exígua da felicidade, mas conseguiam-na descrever se fossem desafiados a fazê-lo. Descreviam-como um ente formidável, uma grandiosidade feita de pequenos saltos no escuro.
Eram acusados de individualismo, pela fortaleza intencional que os tornava insensíveis aos males do mundo. Não se importavam. Fizeram o seu caminho das contrariedades, tiveram de descobrir modos de se protegerem contra os punhais potenciais que o mundo exterior, e as pessoas que o habitam, estão prontos a assestar nos ingénuos, os que não cuidaram de vestir uma couraça contra o meio exterior.
Eram suseranos destas micro repúblicas da felicidade, como se, no que à felicidade diz respeito, o feudalismo não tivesse sido extinto. Erguiam-se contra o terreno lunar, inóspito, dos que negavam provimento à felicidade e dos ingénuos que continuam a acreditar em receitas milagrosas sobre a fruição de algo que não passa de uma miragem aos olhos dos prescrevem aquelas receitas.
Sabiam que a felicidade é feita de passos modestos e ela própria é um módico. Regrada, com critério e sem a soberba da embriaguez de quem finge um estado que não consegue alcançar.
Sem comentários:
Enviar um comentário