Dizem-me que os jovens advogados perderam a noção do razoável. Que abdicaram dos mínimos éticos, desencontrados da decência que no passado já distante sedimentou o prestígio da classe. Hoje vale tudo. Trepam às costas uns dos outros. Corre, à boca pequena, que até tirar olhos é permitido. Como classe, impera uma tremenda hipocrisia: por detrás dos salamaleques andrajosos, espetam cruas facadas nas costas daquele que, minutos antes, fizeram questão que passasse à sua frente numa qualquer porta do tribunal.
Nada me move contra a ambição. É ela que modera o progresso. As grandes façanhas humanas alicerçam-se em actos ambiciosos de alguém. Puros actos individuais, portanto. E só por arrastamento os efeitos se dispersam pelo colectivo. A ambição, essência do individualismo, é pedra de toque do avanço da sociedade. Contudo, às vezes o discernimento cega-se pelo brilho das luzes prometidas pela ambição que já foi alcançada. Façanha atrás de façanha, a fasquia vai ficando mais alta. Perde-se o rasto à moderação; e a ambição confunde-se com a ganância, como a racionalidade cede lugar ao descontrolo de si. Pelo caminho, o individualismo, o salutar individualismo, é possuído por instintos egoístas.
É verdade que a concorrência entre os jovens advogados que procuram consolidar carreira é selvática. Também é verdade que os jovens advogados, deslumbrados com o frenesim da grande cidade, recusam voltar à terrinha que os viu nascer. Seria uma despromoção social. Preferem enxamear o mercado citadino, já sobrecarregado de gente no mesmo ramo de actividade. É um caso típico de excesso de oferta (de advogados) para a procura (de clientes com a justiça à perna). Este desequilíbrio é uma excepção à regra que ensina que a concorrência é sempre salutar. Perante o dilema da sobrevivência que se coloca com dramatismo a muitos advogados em início de carreira, é recorrente a tendência para resvalar para o descaminho da anti-ética. Em muitos casos, mistura-se ambição com ganância e com necessidade de dobrar a espinha dorsal para conseguirem sobreviver.
E os jovens advogados, de golpada em golpada que o seu código deontológico censuraria, transformam um natural instinto de sobrevivência em ambição, que em breve se faz ganância. A uma progressão geométrica: dos cobres que pagam as despesas fixas do escritório e pouco mais; aos primeiros honorários que engrossam a conta bancária à medida que a carteira de clientes cresce. Não faltará muito até que, perdido o norte da decência, se deixam contagiar pela ralé da profissão: oportunistas, aproveitam-se do estado de necessidade de clientes desesperados por terem a espada da justiça a pairar sobre a cabeça. Oportunistas: por levarem couro e cabelo, aproveitando-se do desespero dos clientes – e da sua ignorância.
A ganância faz destes jovens advogados um silencioso carrasco das pessoas a contas com a justiça. Sem que elas consigam perceber as cobaias que são nas mãos dos oportunistas advogados. Sem discernimento, nem conhecimentos, para entenderem que o jovem advogado está pouco interessado em defender os interesses do cliente; a ambição desmedida, chancela da grotesca ganância, desvia o seu olhar para a insaciável sede de açambarcamento material. E se os clientes estão descapitalizados, fazem-se pagar através de bens – carros, apartamentos, consta até que substâncias ilegais aceitam. Só na consciência destes jovens advogados pesará o sombrio cutelo do mau profissionalismo.
Há mais de quinze anos, fazia o estágio de advocacia, passei por episódios destes. Hoje contam-me que o panorama piorou. Com a agravante que a qualidade dos jovens licenciados é mais baixa. Na inversa proporção da ganância com que entram no mercado de trabalho. Fico sem perceber se a raiz do problema está na geração, ou na abundância de profissionais que entretecem um instinto de sobrevivência que, amiúde, cultiva uma gesta de oportunistas sem remorsos. Ou se é apenas a natureza humana a mostrar que a ambição cresce à medida que se saboreiam os triunfos, e em breve se transforma em ganância desmedida.
Por muitas razões não quis ser advogado, terminado o estágio. Uma foi esta: a recusa de conviver com uma classe onde abundam pessoas em quem não se pode confiar um minuto que seja, pessoas que são o expoente da máxima “não olhar a meios para atingir os fins”. E tudo isto me faz questionar se a ambição – em si mesma, salutar – não é uma perigosa avenida que tolda o discernimento e, num passo só, estreita a ponte entre o racional e o ganancioso.
Nada me move contra a ambição. É ela que modera o progresso. As grandes façanhas humanas alicerçam-se em actos ambiciosos de alguém. Puros actos individuais, portanto. E só por arrastamento os efeitos se dispersam pelo colectivo. A ambição, essência do individualismo, é pedra de toque do avanço da sociedade. Contudo, às vezes o discernimento cega-se pelo brilho das luzes prometidas pela ambição que já foi alcançada. Façanha atrás de façanha, a fasquia vai ficando mais alta. Perde-se o rasto à moderação; e a ambição confunde-se com a ganância, como a racionalidade cede lugar ao descontrolo de si. Pelo caminho, o individualismo, o salutar individualismo, é possuído por instintos egoístas.
É verdade que a concorrência entre os jovens advogados que procuram consolidar carreira é selvática. Também é verdade que os jovens advogados, deslumbrados com o frenesim da grande cidade, recusam voltar à terrinha que os viu nascer. Seria uma despromoção social. Preferem enxamear o mercado citadino, já sobrecarregado de gente no mesmo ramo de actividade. É um caso típico de excesso de oferta (de advogados) para a procura (de clientes com a justiça à perna). Este desequilíbrio é uma excepção à regra que ensina que a concorrência é sempre salutar. Perante o dilema da sobrevivência que se coloca com dramatismo a muitos advogados em início de carreira, é recorrente a tendência para resvalar para o descaminho da anti-ética. Em muitos casos, mistura-se ambição com ganância e com necessidade de dobrar a espinha dorsal para conseguirem sobreviver.
E os jovens advogados, de golpada em golpada que o seu código deontológico censuraria, transformam um natural instinto de sobrevivência em ambição, que em breve se faz ganância. A uma progressão geométrica: dos cobres que pagam as despesas fixas do escritório e pouco mais; aos primeiros honorários que engrossam a conta bancária à medida que a carteira de clientes cresce. Não faltará muito até que, perdido o norte da decência, se deixam contagiar pela ralé da profissão: oportunistas, aproveitam-se do estado de necessidade de clientes desesperados por terem a espada da justiça a pairar sobre a cabeça. Oportunistas: por levarem couro e cabelo, aproveitando-se do desespero dos clientes – e da sua ignorância.
A ganância faz destes jovens advogados um silencioso carrasco das pessoas a contas com a justiça. Sem que elas consigam perceber as cobaias que são nas mãos dos oportunistas advogados. Sem discernimento, nem conhecimentos, para entenderem que o jovem advogado está pouco interessado em defender os interesses do cliente; a ambição desmedida, chancela da grotesca ganância, desvia o seu olhar para a insaciável sede de açambarcamento material. E se os clientes estão descapitalizados, fazem-se pagar através de bens – carros, apartamentos, consta até que substâncias ilegais aceitam. Só na consciência destes jovens advogados pesará o sombrio cutelo do mau profissionalismo.
Há mais de quinze anos, fazia o estágio de advocacia, passei por episódios destes. Hoje contam-me que o panorama piorou. Com a agravante que a qualidade dos jovens licenciados é mais baixa. Na inversa proporção da ganância com que entram no mercado de trabalho. Fico sem perceber se a raiz do problema está na geração, ou na abundância de profissionais que entretecem um instinto de sobrevivência que, amiúde, cultiva uma gesta de oportunistas sem remorsos. Ou se é apenas a natureza humana a mostrar que a ambição cresce à medida que se saboreiam os triunfos, e em breve se transforma em ganância desmedida.
Por muitas razões não quis ser advogado, terminado o estágio. Uma foi esta: a recusa de conviver com uma classe onde abundam pessoas em quem não se pode confiar um minuto que seja, pessoas que são o expoente da máxima “não olhar a meios para atingir os fins”. E tudo isto me faz questionar se a ambição – em si mesma, salutar – não é uma perigosa avenida que tolda o discernimento e, num passo só, estreita a ponte entre o racional e o ganancioso.
2 comentários:
Não sou tão céptico. A ambição não nos leva necessariamente para o caminho da perversão egoísta e predadora. Poderá acontecer nos medíocres e naqueles que sendo até brilhantes, carecem de um equilíbrio racional e de uma escala de valores adequada à vivência social. A pessoa pode ser ambiciosa, capaz e bem sucedida e ter escrúpulos, princípios éticos e alguma consciência social. Esses, dificilmente degenerarão.
Não concordo com o Rui Miguel Ribeiro.Concordo com o autor do bloge.Mas também já sei, porque já conheci "elementos" que fizeram parte dos órgãos da OA que me disseram que os M.D.formadores da CNE/CNA querem ver no mercado futuros advogados com fracas qualidades profissionais.Esses passam sempre nos exames.Até porque mais vale ter um(a) incompetente do que um inteligente para lhes fazer sombra.HEEEEEE
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