Não é o medo arcaico, a sofreguidão dos costumes que asfixia a vontade, a bússola orientada. Podem os juízes alheios perorar sobre os comandos da vida, ditar zelosas sentenças morais que determinam comportamentos, que essa falta de juízo não extrai o sumo da vontade.
O que conta é o magma fervente que, em ebulição, se oferece como maré de fundo. A combustão irradia pelas paredes do corpo. Ardem as veias, enquanto interiores modos cuidam de renegar qualquer báscula que adeje sobre o império da vontade. O magma emergente é o caudal por onde a lava dormente se transfigura. Por fora, o corpo exsuda. O suor canibaliza o temperamento – dir-se-á, a propedêutica loucura está mais próxima. Se alguém tocar no corpo, senti-lo-á erubescente, uma fornalha que, em paradoxal instinto, é convidativa.
O corpo em ebulição é o seu próprio caudal. Afasta as margens para os limites que à partida eram impensáveis. A combustão interna ganhou vida própria, não há comando interior que a trave. O corpo parece uma matéria em risco de explosão. Fora do controlo da vontade. Ou possuindo uma vontade que se emancipou da vontade que os bons costumes e o arsenal da repressão ancestral ensinam a respeitar devotamente. O corpo insurge-se contra os costumes, contra as ordenações metafísicas que o tentam domar. O vulcão emergente rumoreja contra os síndicos que se anulam a si mesmos e refreiam os corpos outros (porventura por não conseguirem refrear os deles).
O vulcão fala, vagarosamente, em crescendo, aglutinando as sílabas nas encostas que fervem de desmedo. Avisou que não vai esperar. O rumorejo contínuo é a voz das convulsões internas, o magma ascensional que toma conta das veias. Não esperem moderação. Não esperem medo, que é a antítese do medo caucionado pelos habituais estetas da repressão que está em causa. Esperem apenas a expressão da liberdade.
O vulcão há de ter a fala derradeira, explosiva, quando aos soluços bolçar a lava incandescente que se desprende sem critério pelo espaço limítrofe. Dessa lava que não abraseia o corpo ungido dir-se-á ser nutriente sublime, a prova de um desejo sem freio. O vulcão não se contenta com a ocultação de provas. Derrama-se, avulsamente e sem critério, como se estivesse a agradecer à terra exterior que o hospedou por o ter contido durante a hibernação. Fertilizada, a terra agradecerá em uníssono, abraçada pela lava derramada, os dois, terra e vulcão, arqueados e premiados pelo império a que deram fala.
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