É-nos ensinado, desde tenra idade: a generosidade é uma virtude. Dar é um bálsamo para a alma. Redenção interior, sinal da entrega ao próximo, uma mostra de como a pessoa presenteada diz muito a quem dedica a oferta. Haverá, decerto, o lado negativo do sinalagma: muitos dão por sentirem que esse acto é um dever. Agem contrariados. Será a expiação do ónus com um fito mais longínquo – ganhar a consideração da pessoa presenteada, ou apenas desonerar-se do dever de presentear, quiçá mais um passo no tão ambicionado trajecto rumo à dimensão celestial que chega com a morte.
O que este mundo tem de belo é o constante lugar à surpresa. Seria um lugar enfadonho para viver se tudo fosse previsível, se todos os passos fossem desaguar aos mesmos destinos, com paragem nos apeadeiros de sempre. De vez em quando há imponderáveis. Que nem chegam a ter a conotação negativa do imponderável: de tão patéticos, tudo o que conseguem é motivar um sorriso cínico. Não são imponderáveis, são actos de uma tremenda encenação cómica em que vivemos mergulhados. Este lugar é uma piada contínua.
Sabemos agora que a nossa generosidade com os outros passa a ser taxada. Quem fizer donativos acima de 500 euros está a envolver um terceiro actor na sua generosidade. Pois o destinatário do donativo é coagido a entregar 10%, a título de imposto de selo, nas mãos do faminto Estado. Tento perceber como isto vai funcionar: se vou a um casamento e ofereço um cheque de 500 euros aos noivos, o fisco espera que os nubentes exerçam o seu dever cívico de declarar a oferenda, descontando 10%. Eis a primeira perplexidade: o ministro das finanças está a contar que todos os cidadãos que forem agraciados com a generosidade alheia voluntariamente se declarem recebedores de um donativo. Como todos temos uma apurada consciência cívica, por um impulso natural colocaremos nas mãos do fisco 10% das prendas pecuniárias que recebermos. Não sei se podemos chamar a esta crença do ministério das finanças uma ingenuidade infantil.
Depois há que perceber se a pessoa que fez o donativo aceita pacificamente que 10% da maquia vá parar aos cofres do Estado. Se um magnânimo tio puxa do livro de cheques e distribui 500 euros por cada um dos três sobrinhos por alturas do natal, este é um acto bilateral, um presente do tio a cada um dos sobrinhos. Doravante o tio herda um quarto sobrinho ilegítimo, o fisco (e se faz sentido aqui a qualificação de “ilegítimo”…). Quando os sobrinhos confidenciarem ao tio que um perverso funcionário do fisco lhes comunicou a obrigação de pagar cinquenta euros a título de imposto de selo, o tio poderá ficar indisposto. E perguntará se já não basta o infindável rol de impostos e taxas que, por tudo e mais alguma coisa, subtraem o seu rendimento.
Ainda temos que contar com outra vertente inusitada: o Estado arroga-se ao direito de reter uma percentagem dos donativos. Uma inadmissível intromissão na esfera individual. E um roubo ao que se pensava ser uma virtude – a generosidade. À força, o Estado entra como terceiro parceiro numa relação que se julgava a dois (entre quem oferece e quem recebe o donativo). É o Estado furão, a vigiar de norte a sul quem fizer donativos. Quando o donativo chegar às mãos do felizardo, mesmo ao lado está o cobrador de fraque com a mão estendida, à espera da sua maquia (os 10%).
Isto é socialismo! No pior que o insólito noticia. Afinal a generosidade tem algo de pecaminoso. De outro modo, estaria isenta de impostos. Como cidadãos exemplares, espera-nos o dever de contribuir com um modesto pecúlio (“só” são 10%, podia ser pior…) dos donativos que recebermos. O senhor ministro das finanças estará a contar com mais um acto de bufaria tão típico da pidesca mentalidade que este governo tem revelado: quem for bondoso deve dar conta do acto de generosidade para que o fisco possa bater à porta de quem recebeu o donativo, de mão estendida.
Ficam as lições de tão patética medida. Primeiro, a desmotivação da generosidade. Se tantas vozes que pastoreiam a moral e os bons costumes acusam a emergência do egoísmo e a materialização das relações humanas, este estúpido imposto decerto vai diminuir os actos de generosidade. Segundo, a generosidade deixa de ser uma virtude (ou então temos um Estado abutre, que canibaliza a generosidade alheia). Assim o decretou este socialismo de pacotilha que invade todos os poros da nossa existência.
O que este mundo tem de belo é o constante lugar à surpresa. Seria um lugar enfadonho para viver se tudo fosse previsível, se todos os passos fossem desaguar aos mesmos destinos, com paragem nos apeadeiros de sempre. De vez em quando há imponderáveis. Que nem chegam a ter a conotação negativa do imponderável: de tão patéticos, tudo o que conseguem é motivar um sorriso cínico. Não são imponderáveis, são actos de uma tremenda encenação cómica em que vivemos mergulhados. Este lugar é uma piada contínua.
Sabemos agora que a nossa generosidade com os outros passa a ser taxada. Quem fizer donativos acima de 500 euros está a envolver um terceiro actor na sua generosidade. Pois o destinatário do donativo é coagido a entregar 10%, a título de imposto de selo, nas mãos do faminto Estado. Tento perceber como isto vai funcionar: se vou a um casamento e ofereço um cheque de 500 euros aos noivos, o fisco espera que os nubentes exerçam o seu dever cívico de declarar a oferenda, descontando 10%. Eis a primeira perplexidade: o ministro das finanças está a contar que todos os cidadãos que forem agraciados com a generosidade alheia voluntariamente se declarem recebedores de um donativo. Como todos temos uma apurada consciência cívica, por um impulso natural colocaremos nas mãos do fisco 10% das prendas pecuniárias que recebermos. Não sei se podemos chamar a esta crença do ministério das finanças uma ingenuidade infantil.
Depois há que perceber se a pessoa que fez o donativo aceita pacificamente que 10% da maquia vá parar aos cofres do Estado. Se um magnânimo tio puxa do livro de cheques e distribui 500 euros por cada um dos três sobrinhos por alturas do natal, este é um acto bilateral, um presente do tio a cada um dos sobrinhos. Doravante o tio herda um quarto sobrinho ilegítimo, o fisco (e se faz sentido aqui a qualificação de “ilegítimo”…). Quando os sobrinhos confidenciarem ao tio que um perverso funcionário do fisco lhes comunicou a obrigação de pagar cinquenta euros a título de imposto de selo, o tio poderá ficar indisposto. E perguntará se já não basta o infindável rol de impostos e taxas que, por tudo e mais alguma coisa, subtraem o seu rendimento.
Ainda temos que contar com outra vertente inusitada: o Estado arroga-se ao direito de reter uma percentagem dos donativos. Uma inadmissível intromissão na esfera individual. E um roubo ao que se pensava ser uma virtude – a generosidade. À força, o Estado entra como terceiro parceiro numa relação que se julgava a dois (entre quem oferece e quem recebe o donativo). É o Estado furão, a vigiar de norte a sul quem fizer donativos. Quando o donativo chegar às mãos do felizardo, mesmo ao lado está o cobrador de fraque com a mão estendida, à espera da sua maquia (os 10%).
Isto é socialismo! No pior que o insólito noticia. Afinal a generosidade tem algo de pecaminoso. De outro modo, estaria isenta de impostos. Como cidadãos exemplares, espera-nos o dever de contribuir com um modesto pecúlio (“só” são 10%, podia ser pior…) dos donativos que recebermos. O senhor ministro das finanças estará a contar com mais um acto de bufaria tão típico da pidesca mentalidade que este governo tem revelado: quem for bondoso deve dar conta do acto de generosidade para que o fisco possa bater à porta de quem recebeu o donativo, de mão estendida.
Ficam as lições de tão patética medida. Primeiro, a desmotivação da generosidade. Se tantas vozes que pastoreiam a moral e os bons costumes acusam a emergência do egoísmo e a materialização das relações humanas, este estúpido imposto decerto vai diminuir os actos de generosidade. Segundo, a generosidade deixa de ser uma virtude (ou então temos um Estado abutre, que canibaliza a generosidade alheia). Assim o decretou este socialismo de pacotilha que invade todos os poros da nossa existência.
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