20.5.19

Não publicado


Republica, “Ready to Go”, in https://www.youtube.com/watch?v=JgffRW1fKDk
Mostra-me a matemática imperscrutável. Os fundos marinhos em aquários azulados. A chuva persistente e como não adianta molhar o chão que já está molhado. Mostra-me o lugar incindível onde o todo se aquartela. As matrizes que ecoam as palavras quiméricas e como somos enfeitiçados pela identidade forjada. O vento itinerante, o que alberga nos seus interstícios. Mostra-me a gramática reinventada por fora das convenções (a segunda palavra da frase é que leva maiúscula; as vírgulas foram extintas, assim como os parágrafos; os pontos de exclamação, precedidos por um verbo; etc.).
Mostra-me os dedos que se articulam com a fala, enquanto a fala organiza um pensamento inédito. Mostra-me as confabulações etéreas que sublimam o verbo adiado. Os vestígios de um eco. O sussurro da maresia. O colo em combustão à espera de mãos e de uma boca. A cartografia onde se desenha o desejo. Uma representação das feridas que procuram uma cicatriz. A matemática imperscrutável, outra vez. A teimosia desfraldada no convés onde despojadas jazem palavras irrelevantes dos outros. O veludo a que se abraçam os corpos nus. O tirocínio das almas – mostra-me isso e o demais que anotes em espera. 
Mostra-me as páginas anoitecidas. Os cantos patibulares onde se agigantam os vultos adormecidos. Mostra-me as rugas dos teus lábios, que a minha boca não se demora em seu saciar. Mostra-me: as velas hasteadas no dorso da manhã, nas imorredoiras luzes que emolduram a eternidade. Mostra-me de que é feita a eternidade. A contrapartida de ti nas veias solipsistas de mim. A aprendizagem de ser. As costas pétreas que são ossatura suficiente. Mostra-me as tipografias que só sabem compor letras aformoseadas. Mostra-me: para intuir que não é a caligrafia que importa. E mostra-me o dédalo de onde largamos âncora na errância propositada.
Mostra-me o sibilino arquear do peito sobre as varandas vítreas. O arranjo das almas, em uníssono, como flores pendidas do telhado impecavelmente apessoado. Mostra-me como prevenir a delapidação. A usura infundamentada. Os segredos mantidos no cofre de que somos tutores únicos. Mostra-me o dobro do que sei. As orquestras de que somos maestros. A nossa cátedra, singular arquivo do mundo que aspira a ser o que somos (e jamais conseguirá). 
E mostra-me como são genética conciliação dos nossos seres as palavras tingidas a ouro que resguardamos e que pertencem à não publicação. Os segredos, imaturos ou não, por onde andamos na incansável safra.

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