21.5.19

Fenomenologia das metáforas


Radiohead, “Ceremony”, in https://www.youtube.com/watch?v=cedNya7e8Uc
O que se diz numa metáfora? Palavras intermediadas para por elas dizer outra coisa. Ou de outra coisa cerzir nas palavras em forma de metáfora um caminho diferente para o dizer. O que diz uma metáfora?
As metáforas são um adorno. Podem servir para reforçar uma ideia, usando os termos comparativos para dar ênfase à ideia central. Às vezes, fica mais fácil explicar o que se pretende explicar se não forem usadas as palavras diretas. Ou reforçá-las com indiretas palavras, o conteúdo de uma metáfora, para emprestar vivacidade ao argumentado, fazendo crescer a sua persuasão.
Outras vezes, o recurso à metáfora é uma vaidade estilística. De vaidade se trata, porque se socorre da criatividade para alcançar as palavras que emprestam cor à metáfora. Não está ao alcance de qualquer um. Nestes preparos, a metáfora é como se fosse arrogantemente esbofeteada no rosto do recetor, para que se faça constar, junto da sua pessoa, que o autor de metáfora tão sibilina é um espírito superior e vive ungido por uma inspiração rara. 
As metáforas podem ser um ardil para engrossar um argumento com prosápia. É nos casos em que se somam metáforas atrás de metáforas, e o autor constantemente de atalaia à imaginação para as capturar quando elas assomam ao pensamento. De tantas metáforas serem usadas, o texto fica quase vazio. Mais parece um concurso de metáforas, deixando o essencial contaminado pelo acessório. Já fui testemunha de um palimpsesto de metáforas: metáforas que germinam de metáforas, numa cascada de metáforas que, a páginas tantas, impede a lucidez sobre a metáfora inicial e as que se lhe seguiram – e sobre o fio condutor entre a primeira metáfora e a que lhe sucedeu como epílogo.
Aa metáforas são como quadros pintados pelo meio das palavras. E por meio de palavras. Acentuam a imagem que desfila no horizonte mental do recetor. Encavalitam-se na realidade que se presta à metáfora, como se ela passasse a ser composta por duas camadas: a que interage com as palavras que a descrevem faticamente; e as que pertencem à metáfora, que se acrescentam ao seu lastro inicial. 
As metáforas deviam obedecer a um princípio geral de sobriedade. Para prevenir que um recurso estimável seja banalizado e perca utilidade. A escrita não é um concurso de domadores de metáforas. É o resto.

Sem comentários: