LCD Soundsystem, “Dance Yrself Clean” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=L_SJUJHPi5w
Tremiam as mãos. O coração, acelerado e exíguo dentro do peito. O peito, pequeno para o albergar. O suor a banhar o corpo todo (e não era por estar calor). Os sobressaltos todos alinhados no mapa diante do pensamento. Talvez fosse melhor remeter-se a uma gruta e levar uma vida monástica. Talvez fosse melhor...não sabia o que seria melhor.
Os pés pareciam pequenos para suportar tanto peso do corpo. Um formigueiro era visita frequente. Era como se estivessem a espetar pequenas espadas em pontos sensíveis do corpo, um castigo qualquer. Sabia: se houvesse um tribunal para castigos como punição de contratempos da consciência, não se livrava do banco dos réus e de uma cominação talvez parecida com o formigueiro que o atormentava. Se lhe dissessem que somos todos de igualha semelhante e que ninguém escapava ao libelo acusatório dos beatos do formigueiro, não lhe interessava. As suas dores eram suas, não eram as dores dos outros. Não tinha por hábito copiar os outros, nem muito menos justificar-se através dos atos, mundanos, dos outros.
O relógio estava parado. Nem deu conta – o que era de estranhar, tão viciado no mostrador do relógio, não fosse perder a meada ao tempo. Estava parado. E, investigou, pelo fuso horário de Asunción, Paraguai. Às vezes dava jeito que o relógio estivesse parado. Se esse fosse o pretexto para suspender o tempo e, através da suspensão do tempo, as tidas por irrecusáveis tentações não conseguissem respirar. Afinal de contas, nada disso interessava. O relógio estava parado pelo fuso de Asunción, Paraguai, mas o tempo não deixou de fazer a sua roda habitual.
Prometeu que se esqueceria de mudar a pilha do relógio. Ficaria pelo fuso de Asunción, Paraguai, até se sobrepor a angústia de não saber que horas eram. Mas nem isso estava certo. Àquela hora, os ponteiros do relógio já não quadravam com o fuso de Asunción, Paraguai. Afinal, era um anti-herói. Reformulando: a antítese de um herói. Um homem banal. Incomodou-se e logo a seguir desincomodou-se. Um homem. Banal. Lá diz o lugar-comum: de carne e osso, com sangue transferível, os ossos duros, o pensamento letárgico, um interesse relativamente fugaz pelas coisas à sua volta, porventura o epítome do mundano – e o demais, que os lugares-comuns mandam dizer. Não seria diferente de um numeroso exército desfardado que desfila à sua volta.
Em seu proveito, uma narrativa inventada na altura (rompendo com a inércia habitual do pensamento): a antítese de um herói, o homem banal, talvez seja a representação moderna do herói. Se é que precisamos de heróis, ou sequer de modernidade. A fragilidade dos homens banais converte-os em super-homens. Sem que eles saibam. Sem que eles queiram. Mesmo que não consigam ordenar que o fuso de horário de Asunción, Paraguai, esteja sempre em sintomia com o relógio. Porque este é o tempo de paradoxos.
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