Thom Yorke, “Unmade” (Live from Electric Lady Studios), in https://www.youtube.com/watch?v=TxHgmAFkNyI
Corta a eito. Sem medo dos rochedos que se precipitam no vazio, pois as fráguas prestam-se para miradouros – e é nos miradouros que se rejeitam as névoas inconsequentes. Se ao menos os braços não estivessem murchos; as pálpebras não se intimidassem com o sol a pino, neste Verão a destempo: podias congraçar a caligrafia aprumada em distintas folhas de papel, acreditando que é a condição suficiente para a boa literatura. Talvez não soubesses que estavas sitiado numa profunda ilusão. A miragem do encantamento pelo belo esconde as dores mais profundas em que se consome a complexidade. A ilusão é parte deste divórcio. Nela medram exércitos numerosos que não intuem que são a ilusão de si mesmos. Ao menos, compõem. Expõem ideias, numa articulação talvez duvidosa, ou pelo menos ininteligível aos outros. Não capitulas. A inteligibilidade é sempre uma armadilha povoada pela subjetividade. Tanto chega para arrotear um roteiro diferente, um que seja sopesado pelas mãos operárias do seu próprio autor. Pode ser que não mereças crédito. Não importa. Cada um de nós é o seu universo privativo – e ele não é tão pequeno como às vezes os fiéis depositários da vida em coletividade pretendem. Por isso, arrisca as ideias improváveis. Arrisca, até, o obnóxio. A ácida condição metida à prova das próprias palavras que se desprendem no etéreo pensamento e se imortalizam em palavras escritas, com residência fixa numa página de papel. Até que, por ato volitivo, decidas voltar atrás e destruir o que julgavas ser uma manifestação de eventual perenidade. Pois às vezes, o bolo é apenas uma imagem que se oferece ao olhar guloso. Dissolve-se por ação do olhar guloso. Mas o bolo esconde um recheio e é do recheio que devem tratar as ponderações que gravitam no aceso olhar. Não cuides do bolo na sua totalidade. Contenta-te com o recheio, que contém a essência a que se resume a altiva, mas ao mesmo tempo humilde, condição tua.
Sem comentários:
Enviar um comentário