22.8.25

Post Scriptum (short stories #500)

Nirvana, “Heart-Shaped Box”, in https://www.youtube.com/watch?v=KAUMUphTq_s

          Só mais isto, ou aquilo, ou ainda talvez o que acabarei por me lembrar de dizer para que a conversa não tenha um remate prematuro. Um par de frases a mais: prefiro ter de dizer mais do que estava para ser dito do que me arrepender de ter escondido as palavras na austeridade do silêncio ou sob a tirania do esquecimento. Nem que seja sob a forma de um post scriptum, a adenda significativa. Não é como uma nota de rodapé, que deixa para plano secundário o que não deve ficar omitido, mas não tem privilégio de informação centrípeta. O post scriptum é o que ainda falta dizer depois de se pensar que estava tudo dito. É um ainda vamos a tempo de dizer isto mais. A alocução que pode fazer a diferença. Às vezes, o post scriptum deixa para memória futura as palavras que não podiam ficar omitidas, sem que elas façam muita diferença – são um acrescento que completa o que havia sido dito. Outras vezes, o post scriptum é gerido com perícia para se tornar o coração da mensagem. Diz-se quase tudo o que tem de ser dito. Intencionalmente, a melhor parte fica guardada para o final. O post scriptum transforma-se no ator principal da mensagem. É a conclusão do que tinha acabado de ser dito. Tanto pode ser a conclusão esperada como a revelação que ninguém estava à espera. O post scriptum é a revelação do que não podia ficar sitiado pelo silêncio ou pelo esquecimento. Se não fosse o post scriptum, o propósito das palavras precedentes ficava incompleto. Talvez o destinatário não o consiga pressentir antes da revelação do post scriptum. Quem fala é que tem o encargo de convocar o post scriptum. A ele cabe saber se há palavras que ainda esperam por vez, para não torturar o propósito da conversa. 

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