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Este Agosto senescente, em ruptura com o almanaque meteorológico. A alvorada não trouxe os já quentes raios de sol; o tecto do céu, composto por uma cama de nuvens densas, a sitiar o dia sob a ameaça da chuva. Se tivermos como bitola os anos normais em que Agosto é o mês dos píncaros da canícula, este foi um Agosto timorato. As correntes atmosféricas puseram-nos à mercê da madrasta climatologia do analgésico centro da Europa.
Mesmo aqui (onde o peito se abre, corajoso, para as habituais nortadas que refrescam as temperaturas que uma dezena de quilómetros para o interior já são tórridas) costumava haver meia dúzia de dias de canícula com perfume ao deserto do Saara. Aquelas noites em que o corpo desnudado nem sequer o fino lençol aguenta. As noites mal dormidas acompanhadas pela sinfonia do vento que, sabemo-lo de cor, sopra de leste em presságio de abrasadoras temperaturas. Dou conta de mais um, entre tantos, paradoxos com que nos debatemos: esses dias de suar as estopinhas não deixam saudades. E, contudo, olho o mês de Agosto que por aqui houve e estranho a ausência de, ao menos, um par desses dias com sabor a Verão mediterrânico.
Os cientistas seriam convocados com o seu saber a dar resposta a esta interrogação: por onde anda o aquecimento global que ameaça liquidar o planeta? Diriam, talvez, que uma observação meteorológica regional não compõe uma regra nem desfaz uma tendência global. E diriam, ainda com mais persuasão, que um ano de excepção é isso mesmo, um ano de excepção. Um Agosto fora dos cânones não é sinal de que o aquecimento global se fragmentou no seu contrário.
Para o caso, pouco interessam as certezas da ciência (e as armadilhas do aquecimento global). O corpo estranhou um Agosto timorato, generosamente plácido por ausência de soalheira. O corpo só estranhou – como um norueguês teria estranhado um Inverno sem um floco de neve. Mas não se queixou.
Post scriptum: a partir de amanhã o novo acordo ortográfico passa a ser a norma.