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Havia um truque para as férias em paz, o bálsamo para trazer o corpo e o espírito renovados para casa: nada observar, ser um autista localizado. Como se fosse possível desligar o entendimento nos dias que correspondessem ao descanso. Para nada ver em redor e descansar, que é para isso que as férias têm serventia.
Sem temer os rótulos (e o pior, por estes dias de açambarcamento da democracia, é ser apostrofado de “fascista social”), lá vai o relambório: uma aldeã viseense a reclamar na caixa do supermercado pelo preço da melancia; o patusco sexagenário com as faces rosadas à saída do restaurante (talvez mercê da barrigada de tinto que embuchou), ostentando garboso palito amparado pelos cantos da boca ainda untuosa; a senhora, também sexagenária, que na mesa do lado não esperou pelos palitos e puxou da amestrada unha mindinha para remover as sobras do jantar das grutas entre dentes; a senhora com ar beato a ensinar ao petiz que, tal como o coleguinha da escola, muitos meninos são filhos de pais separados (e a dizê-lo com ar de comiseração beata, ficando sem saber se as vítimas da comiseração eram os petizes ou os progenitores); a pós-adolescente gorda que, macambúzia, do lado contrário da piscina cortava as unhas dos pés enquanto esperava pela chuva extemporânea de Agosto; os jovenzinhos que se deitam às nove horas da manhã e que passeiam, quando acordam da ressaca, uma parafernália de pulseiras de plástico de cores berrantes em sinal de visitação aos lugares de culto nocturno; e o trânsito avantajado, como se isto fosse uma urbe cosmopolita, a mostrar que vir de férias para estes lugares é a expatriação das cidades em peso – e lá vai o sossego das férias para o altar das miragens.
No fim de uma semana de ócios estivais, só apetece liquidá-los. Ontem, um amigo dizia-me ao telefone: a cidade está deserta. Pudera. Os das grandes cidades mudaram-se para a orla sul. Como deve estar apetitosa a cidade.
(Em Vilamoura)
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