11.9.18

Pós-moderno (short stories #28)


Viagra Boys, “Sports”, in https://www.youtube.com/watch?v=QjL7D33xpS4
          Os garfos em cima de mesa, protocolarmente deitados em sinal de fim de refeição, deixaram de ser modernos. Tiveram uma modernidade efémera: duraram enquanto foram serventuários da refeição (enquanto a cultura não decide mimetizar costumes outros que ensinam a comer à mão – talvez uma proposta de modernidade que ensaie seu lugar). O livro acabado de ler também perdeu serventia. Por mais que convoque os leitores para uma visão ousadamentefuturista sobre os temas contemporâneos (ao jeito dos iluminados que estão sempre três – ou mais – passos à frente dos demais, dando-lhes uma vantagem de presciência que termina vertida em forma de livro), e por mais que tenha feito, enquanto leitor, um esforço para ao menos compreender o argumentado, o livro perde a voraz modernidade porque as ideias foram assimiladas e as sinapses decretaram a sua falência como ideias aceitáveis. A própria maré alta, prevista para as dezasseis horas e cinquenta e sete minutos, será arcana quando tiver o seu epílogo e for substituída pela maré a vazar. Os gurus de qualquer coisa, visionários do domínio de sua peritagem, são nomeados por si mesmos zeladores da vanguarda. Ufanam-se de estarem à frente dos comuns mortais (como se fosse possível, por esse ato de diferença, garantir um estatuto de perenidade). Ficam no limiar da apoplexia quando são desafiados por oponentes ou – o que piora o diagnóstico – dissidentes. Entram em negação quando lhes provam a falsa fartura do proclamado. Não aceitam que os pergaminhos da modernidade, quais faróis que dissolvem as trevas do atavismo e garantem a claridade benigna aos demais, sejam hipotecados. Insiste, em protesto contra os arautos de qualquer modernidade: a modernidade esgota-se no momento da sua tradição. É o tempo, não açambarcável como o vento que se desembaraça dos dedos, que atraiçoa os titulares da modernidade. Menos sentido se intui aos rótulos que atiram a modernidade para avançados estados de maturidade. Se a modernidade se consome na efemeridade inata, não é o ardil de adicionar o “pós” à “modernidade” que a salva do rogatório obsoleto.

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