2.3.09

Ao nível de seita


Este fim-de-semana não vi noticiários. Havia o congresso do PS. O vício de ler jornais trouxe, contudo, umas pinceladas do congresso que mais parece ter sido um colectivo exercício de onanismo. Lá se foi o efeito terapêutico dos olhos fechados aos noticiários das televisões.


O mal será meu, decerto, habituado a desconfiar até ao tutano da seita socialista. Então agora que passam pela inebriante sensação do poder absoluto, coisa tão ansiada desde que se acham depositários maiores do pulsar democrático, é quando o verniz estala e ficam à mostra os tiques salazarentos de quem geneticamente confunde poder com autoridade – como se o poder só pudesse ser exercido de maneira autoritária.


O guru, com aquela pose e oratória condizente com um delegado de propaganda médica (sem ofensa aos ditos), personifica este estado de alma. Eu que sempre o tive em péssima consideração, sentimento esmerado quando foi entronizado timoneiro da pátria e abocanhou o poder de maneira autoritária, cultivei um hábito imprescindível para a pessoal higiene mental: mudar de canal sempre que ele aparece, na tal pose de delegado de propaganda médica, com o discurso sempre exaltado, no papel de vítima que se calha tão bem, pois sabe que o povaréu gosta de Calimeros.


Os que têm cartão de sócio do PS, desde o militante anónimo da província ao militante anónimo da grande cidade até aos senadores que gravitam na órbita do poder, vejo-os abutres das sinecuras de um Estado clientelar. Ao cabo da legislatura, sinto um cansaço tremendo desta gente. É a sensação de um polvo com imensos tentáculos que sufocam tudo o que se mexa e que não cultive a adoração da seita e do seu querido líder. Ao cabo da legislatura, apetece ainda mais remeter esta gente para fora do púlpito onde passeia ostensivamente o poder. É quando a faceta de seita se faz notar em todo o seu esplendor. Dizem os analistas que a encenação feérica montada no congresso faz parte de uma estratégia em ano de eleições – de três eleições diferentes, por sinal. A vitimização do querido líder, os ataques à imprensa que não anda com o PS ao colo (uma minoria dela), a teoria da cabala, os discursos inflamados que arregimentam apoios dentro e fora das hostes – os ingredientes necessários, argumentam os analistas, para o objectivo supremo. A manutenção do poder.


Entendo que assim se comportem. Imagino, que nunca o tive entre as mãos (o poder): quem gosta de ser arredado do poder que tem entre mãos? Faz parte do jogo democrático. Tanto a regra da alternância como a possibilidade do partido do governo lutar pela continuação no poder. Deve ser isto que os estrategas socialistas prepararam. Um pouco para consumo interno, que as hostes não precisam de incentivos para darem à perna, senão as sinecuras dissipam-se na regra da alternância. Mais para consumo externo, que a maioria absoluta está em risco (dizem-no as falíveis sondagens) e quem se habituou a abocanhar sozinho o poder prefere não ter que o partilhar com ninguém.


Entendo tudo isto. Como até entendo que a seita socialista ostente pesporrência por estar convencionado, e com acerto, que as alternativas são uma desgraça. (De resto, esta ideia dava pano para mangas: ainda que corresponda a um sentimento enraizado, martelar a tecla da pobreza dos rivais não é uma insidiosa maneira de empurrar o povaréu para a inevitabilidade de votar PS? Cá está a irrecusável vocação de partido clientelar do poder, como se os socialistas, e apenas eles, pudessem estar no poder. Isto é uma forma de União Nacional com a legitimidade caucionada pelo voto.) Todavia, quanto mais mostram apego ao poder, quanto mais se vangloriam que a esta terra só resta ser governada por eles ou por eles, mais sinto que deviam ser desapossados do poder. Já nem me interessa saber por quem. Pior que esta gente, esta gente tomada pela mediocridade e pelo oportunismo dos que se agarram ao poder que nem lapas, não pode haver.


A encerrar, alguma perplexidade a propósito de um apagão que interrompeu o congresso numa das noites. Agora que tanto enfatizam a "campanha negra" contra o timoneiro, será que o apagão não fez parte dessa campanha? Assim como assim, se a campanha é "negra", o apagão semeou o breu na sala onde estava a acontecer o congresso. Caça às bruxas na EDP, é o capítulo que se segue, da autoria do grande Torquemada, o Santos Silva que adora malhar em quem não teve a sensatez de ser do PS.

2 comentários:

Anónimo disse...

O que espera um estudioso da Europa, do anunciado candidado ás europeias? MLV

PVM disse...

Espero muito pouco. O candidato é um "independente" que é mais "socratista" que o próprio (visito todos os dias o blog dele para me deliciar com o facciosismo constante). E não pode repousar na estaleca de académico reputado: porque a UE não é a sua especialidade; e porque manipula o estatuto de quase "senador" para torcer verdades à medida dos seus gostos. Talvez resquícios do passado mais tingido de vermelho.