20.3.09

Um contentor é um contentor é um contentor


Por estes dias, a directora da DREN é o meu cromo preferido. A senhora só consegue ser notícia por motivos risíveis ou pela ridicularia que sobre ela se abate. Ora são atropelos à gramática portuguesa, ora aparições televisivas com a escorrência da mais deplorável arrogância, ora confusões conceptuais que, por junto, expõem o calibre da jactante personagem.


Desta vez mudou o registo. Já não foram os atentados à língua nativa que fazem da senhora a mais improvável ocupante do cargo. Agora foi uma tremenda confusão mental, ou, do alto da sua esperteza saloia, a tentativa de espalhar a confusão – mas só entre os néscios. Descobriu-se, numa freguesia rural de Barcelos, que alunos de etnia cigana estavam a frequentar aulas num contentor, separados dos restantes colegas. Logo a seguir veio esclarecimento da DREN, com a pontuação no sítio, sem palavras descontextualizadas e com exemplar concordância verbal. Aquilo era uma manifestação de discriminação positiva. Os alunos ciganos estavam a ter aulas à parte porque um crânio da DREN (com a ajuda de um bando de intelectuais que vegetam na vanguarda da engenharia social) decidiu que essa era a solução perfeita para a integração dos ciganos e para a eficácia da sua aprendizagem. A isto chama-se, digo eu, uma exemplar política de integração através da indiferenciação étnica.


É o problema de se ser mais papista que o papa. Estes "cientistas sociais" tanto querem moldar a realidade segundo as suas teorias, tanto querem promover a igualdade à força da martelada, que acabam, porventura distraidamente, por caucionar deploráveis discriminações. A senhora directora da DREN foi convidada a comparecer numa estação de televisão para fornecer explicações. Na pose habitual, tão ao jeito do arrivismo da função pública com bênção do partido certo que enche estas personagens de prosápia e arrogância em doses cavalares, a senhora esboçou uma explicação para a medida de "discriminação positiva". Só conseguiu meter os pés pelas mãos. E ser desmentida, no dia seguinte, pelo presidente da junta de freguesia e pela matriarca no acampamento cigano. Já não chegava a aura de incompetência que a acompanha para todo o lado, agora carrega também o opróbrio da mentira. Já começo a sentir comiseração.


O naco delicioso estava reservado para a passagem da entrevista em que a todo-poderosa, naquela pose de quem tomou alarvemente um poder que nunca ousara sonhar ser seu, corrigiu o jornalista que a interpelou por ter acantonado os alunos ciganos em contentores. Foi como se uma professora primária desse uma reprimenda enfatuada no menino em idade escolar, corrigindo-lhe a impertinência: não são contentores, são "monoblocos".


Voltamos aos problemas de uso da língua. Dantes era só a expressão escrita a revelar alguma – como dizê-lo? – ineptidão da personagem. Confirma-se a extensão da patologia: é um problema total com a língua nativa, também na expressão oral. Alguém devia ensinar à senhora o significado de eufemismo. E, de seguida, enfatizar que "contentor" e "monobloco" são palavras diferentes para a mesma coisa (de resto, palavra ausente do dicionário). É como se alguém dissesse: "preto não, negro".


Já que há dias o bardo oficial da pátria, aquele que tanto incómoda o timoneiro da dita, enriqueceu as letras com um poema sobre contentores, sugiro que se deixe tomar por um novo momento de inspiração e ensaie uma sequela do poema. Para homenagear os "monoblocos", essas soberbas edificações para onde os alunos são atirados em invejáveis condições de aprendizagem. Ao bardo dava-se liberdade criativa. Só se exigia que prestasse homenagem à – como adjectivar? – directora da DREN, sua musa inspiradora.


A esta margarida personagem, um pedido encarecido: continue com a ostentação de poder e com a ânsia de protagonismo. Apareça mais nas televisões, nem que seja com aquele ar de bulldog enraivecido que se curva na direcção da câmara que a filma quando impertinentes jornalistas formulam perguntas incómodas, como se quisesse engolir a câmara e tudo o que está do lado de cá. Apareça muito, desempoeire a sua prosápia, delicie-nos com carradas da inexplicável altivez que, essa sim, é sua especialidade. É que esta terra tão cinzenta precisa de cinzentas personagens em bicos dos pés a fazer figuras circenses. Precisa, e muito, para se rir, parafraseando Mário de Cesariny, como "os lavados e muitos dentes brancos à mostra".

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