22.12.11

Casa velha


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Podíamos pintá-la. Podíamos mudar o sítio aos móveis. Ou apenas juras. Juras de que debaixo dos tapetes uma centelha diferente haveríamos de encontrar. Mas a casa era velha. Irremediavelmente velha. Nem que a batizássemos com aguardente forte, nem que ela fosse curada por uma brigada de higienização, ou viesse um vendaval que, num abrir e fechar de olhos, a virasse do avesso, a casa deixaria de ser velha.
Porventura não reparámos que era velha a casa. E quando demos conta, já só sobravam os escombros de que éramos prisioneiros. A casa, a tão magnífica casa que se entronizara bastião, desabara ao cabo de um fino abalo telúrico. Olhamos para trás, para as cinzas que assentaram onde outrora fora chão. E sabemos que a casa entrara em ruínas bem para além do que o horizonte insinuava.
Agora sobra tempo presente. Futuro por consumir nas delicadas pétalas da incógnita. Já não adianta a contabilidade das ilusões pretéritas. Que importa saber porque soçobraram os alicerces da casa antiga? Por acaso o tempo retrocedia, por artes mágicas, a antes dos tijolos abrirem fendas? Uma casa velha é um lugar onde não apetece regressar. É uma capitulação inútil. Só tem consigo o odor à poeira sedimentada no chão, a poeira onde tanta chuva entretanto repousou, adulterando o seu odor. A poeira entretanto despenteada pelo vento que soprara furioso. A casa velha é uma compilação de lembranças. Elas também tão inúteis como remexer com as mãos cansadas na terra exaustivamente sulcada.
Apetece partir em demanda de uma casa nova. Ainda com o cheiro ao verniz do soalho acabado na véspera. Ainda com o brilho da tinta a corar as paredes para o acolhimento. Uma casa hospitaleira. Despida de móveis, em bruto. Pronta a ser mudada por dentro, preenchida com móveis nem que seja num propositado mobiliário minimalista. Os pleitos, por enquanto em hibernação, esperam uma pedra tumular que os devolva ao pretérito selado. Nessa altura, já não haverá casas velhas por apascentar.

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