Maria Teresa Horta numa reacção inflamada contra uma sátira do Inimigo Público, que ousou fazer paródia com uma das papisas do feminismo. Ou de como “não se brinca com coisas sérias”. Carla Machado, no Público, no habitual arrazoado feminista que por ali destila quinzenalmente, um sectarismo pungente, terminando por afirmar que faz todo o sentido o congresso feminista que lá para o fim da semana vai acontecer em Lisboa. E uma outra docente da Universidade do Minho a que foi dada a palavra no mesmo jornal (já há mais de uma semana), que se atirou ferozmente a uma campanha publicitária que se socorre de mulheres para sensibilizar a urgência da separação dos lixos.
Maria Teresa Horta, um dos ícones do feminismo local, na revelação da sua intolerância. Reclama limites para o humor, confundindo o humor com jornalismo para invocar o código deontológico dos jornalistas em sua honra. Já não é a primeira vez que se testemunha gente condoída porque alguém afinou prosa satírica. Gente incapaz de ser alvo do humor alheio; nessa altura puxam lustro aos galões, aos galões da intolerância, para reprovar a paródia. Com os outros pode-se fazer humor. É a gente que se leva muito a sério, macambúzios decerto, sobre eles sempre pairando uma nuvem pesadamente cinzenta. Lá dos seus maus fígados escorre um poroso, putrefacto líquido: até na sátira discernem palavras carregadas de seriedade, quando a sátira é a negação da seriedade.
Gente muito séria, penhora de causas inatacáveis, causas que se divinizam através das suas sacerdotisas. Para o feminismo devia existir lei da república a proibir registos de humor em achincalhamento das feministas ou da causa. No fundo, uma religião sem sagração de um deus – ou a mulher como sua deusa intocável. Uma religiosidade que não admite sátira. As suas fervorosas defensoras, as primeiras a assegurar que não se parodiam coisas sérias. Devem fazer parte daquele escol de eternamente mal dispostos que veriam com bons olhos a definição legal das áreas insusceptíveis de mordacidade. Não percebem como a causa perde credibilidade à medida que chama a si a aura de uma qualquer religiosidade.
Quanto mais se doerem com o tom jocoso de humoristas, mais a jeito se põem para exercícios de humor refinado. E quanto mais se indignarem, quanto mais for a sua postura tão séria e ofendida ao notarem que foram “vítimas” de humor alheio, só conseguem arregimentar um exército de fiéis seguidoras; os demais, na percepção de que estão diante de um fundamentalismo, tão reprovável como qualquer outro fundamentalismo, para lugares bem distantes deste antro em avançado estado de decomposição.
Estas feministas cegas têm uma atracção pela teoria da conspiração. Uma retórica estafada que desagua sempre na mesma asserção: as mulheres continuam a ser vítimas da brutalidade masculina e de ostracização social, muitas vezes alimentada pela incúria de muitas mulheres que não perceberam que são vítimas da sociedade em que vivem. O estado de descontentamento é perene, é o agente do activismo frenético. Se o que ambicionam for conseguido – a plena igualdade de sexos, sem qualquer discriminação, banidos para sempre os maus tratos que vitimam o sexo feminino – as activistas do feminismo entrariam em transe, desorientadas por lhes faltar a causa mobilizadora. Adivinho o sabor amargo da vitória: o que fariam depois? Contentar-se-iam com um observatório da igualdade, só para fiscalizar desvios que fossem retrocesso na conquista selada? Não acredito. Este é um activismo que se alimenta das desigualdades. São o seu oxigénio.
Ao reler o artigo de Carla Machado e ao recordar-me do que foi escrito, já na semana passada, pela outra docente da Universidade do Minho, a espantosa concepção do chifre na cabeça do cavalo. Carla Machado resgata dados de estudos sobre violência entre casais, concluindo que é esmagadora a violência masculina sobre as mulheres. Que interessa se a evolução da sociedade – evolui, não evolui? – mostra a diminuição de casos de violência conjugal? Que interessa, até, que haja uma lei que convida a vizinhança a ser delatora de suspeições de violência conjugal? O que interessa é que continua a fazer sentido um congresso feminista, porque as mulheres continuam a ser vítimas da discriminação.
A outra senhora – de que não me recordo o nome – teceu uma fantástica teoria sobre o anúncio televisivo onde desfilam femininas figuras públicas apelando à separação dos lixos. Às urtigas a consciência ambiental, que na escala das prioridades cede lugar ao sacratíssimo feminismo. A cronista de ocasião entrou num labirinto que mostra o pior da teoria da conspiração que move estas feministas. Aquele anúncio é deplorável, argumenta a senhora, porque passa a mensagem de que é às mulheres que está reservada a função da separação dos lixos. A prova cabal da vetusta ideia da separação de funções, muitas delas atribuídas em exclusivo à mulher na sua condição de “dona de casa”. Também aqui não interessa perceber que o objectivo é sensibilizar para a separação dos lixos, um instrumento ao serviço de um ambiente melhor. Um exemplo: cá em casa, sou eu que faço a separação dos lixos. Há muitos fantasmas a povoar a cabecinha complicada destas feministas.
Tão reprovável é um marialva que maltrata mulheres, como um antiquado homem (novo, de meia idade ou idoso) que cauciona de mansinho a desigualdade entre homens e mulheres, como estas sacerdotisas do feminismo cego.
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