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É nos dias de greve que mais
tenho orgulho em ser sindicalista. A luta contra o governo que acoberta os
interesses do grande capital e a aflição do patronato fazem destes dias uma
recompensa ímpar. E são dias cansativos, longos, que os piquetes de greve se
começam a organizar às primeiras horas do dia, ainda a noite está a meio do
percurso.
Como tenho responsabilidades
no sindicato, durante a noite ando com os meus camaradas dirigentes de piquete
em piquete. Nos serviços públicos onde a adesão à greve é total, os piquetes servem
para conviver e para maldizer a política do governo de direita do momento (que,
para mal dos trabalhadores, está sempre um governo de direita em funções). Os
piquetes têm mais tensão quando há fura-greves, esses traidores à causa
operária, ou os ignorantes que desertam da causa que os devia acolher e fazem o
jogo torpe do patronato. Os covardes que querem ir trabalhar em dia de greve
deviam ser expulsos do sindicato (se não vivêssemos em permanente governo de
direita, com tiques fascistas, que não tem coragem de impor a sindicalização
obrigatória).
Como há sempre os traidores
que impedem uma adesão de cem por cento à greve (que a adesão total devia ser
decretada em forma de lei), os camaradas dos piquetes organizam-se para a
intimidação. Começamos de antevéspera, com persuasivas visitas às empresas
sensíveis, catequizando os trabalhadores. Aos que costumam ser relutantes, fica
bem sussurrar ao ouvido ameaças que põem em causa a sua posição no serviço. Se
houver podres pessoais, usamo-los sem hesitação. Se nem assim forem demovidos
de entrar nas instalações quando elas deviam estar fechadas por causa da greve
(outra aberração possível porque há uma direita estrutural no poder), os
camaradas apinham-se à entrada.
Usamos a tática da lata de
sardinhas. Ficamos tão apertados, tão juntinhos uns aos outros, que sentimos a
pulsação e o arfar do camarada que está colado a nós. Para alguém entrar na
empresa tem de ouvir das boas e apanhar uns escondidos sopapos. É por isso que
gosto de greves. Vou para os piquetes e, com o corpo avantajado que tenho, os
camaradas escolhem-me para a intimidação, física se preciso for, para convencer
os trabalhadores tresmalhados a meterem marcha-atrás. Mas do que gosto de mais
é de ficar próximo de uma camarada voluptuosa (que as há sempre, voluptuosidade
em grau variável) e, devido à proximidade, sentir as suas carnes firmes.
Fazem-se grandes amizades nos
piquetes de greve, é o que vos afianço.