In http://jornalcidade.uol.com.br/fotos/Tempo/fotos_05071231.jpg
Não é por falta de assunto,
que se costuma dizer que quando a conversa é sobre o tempo é porque não há mais
assunto para servir de fermento à conversa. Mas a visitação de ar polar
(explicação do meteorologista de serviço), que deixou uma chuva própria de
novembro e até neve nos mais altos promontórios da serra da Estrela (neve em
junho!), dá que pensar. A primavera anda poltrona (feminino de poltrão). Na sua
imensa preguiça, contaminada pelas aragens ventadas desde as longínquas
latitudes árticas, a primavera sentou-se na poltrona e, de braços recostados nos
forros laterais, vai-se indo embora a outorgar o outono ao verão que vem daí a
um nada.
Em contrapartida, as notícias
anunciam que as temperaturas estivais estacionaram no centro da Europa. Países
que nos invejam pelo clima que cheira a exotismo andam aflitos com mais de
trinta graus. Talvez seja uma vingança ensaboada pelos “alemães” (o estereótipo
para o malévolo que existe na Europa) sobre os latinos. Mas é uma vingança que
se escorraça para cima dos “alemães” que, coitados, não estão habituados a
sofrer tanta canícula ainda nem o verão dobrou o equinócio respetivo. Pois não
se diz por aí que os “alemães” nos consideram, latinos, preguiçosos? E que essa
preguiça está para os latinos como o calor tórrido está para o verão mediterrânico?
Já que estamos em crise, e
daquelas que se arrasta pelo lodo como fazem os rodovalhos que não saem do
fundo do mar, os “alemães” encomendaram serviço generoso ao patrono do clima.
Mandaram servir primavera poltrona e, diz-se por entre especulação em contramão
com a ciência, um verão com chuva a mais e calor a menos. Ao menos os latinos
não vão sufocar com o calor abrasador. Não teremos desculpa para a má figura
nas comparações da produtividade. Os “alemães” é que a sabem toda: a encomenda
de uma primavera preguiçosa e de um verão sisudo é a oferenda aos latinos
mergulhados na crise teimosa. Os latinos estarão mais dispostos a trabalhar,
uma vez que o calor não os vai distrair.
(E as distrações correm por
conta da criatividade: ele é a temperatura elevada que torna madraça a
capacidade de trabalho; ele são as cervejas que aplacam o calor, mas açambarcam
a lucidez que se quer para o trabalho; ele são as colegas de trabalho que
envergam trajes aligeirados, deixando as curvas mais à mostra, com os custos no
tempo que os marialvas dedicam a apreciar os contornos corporais e deixam
hipotecado ao labor que se lhes paga.)
Mas a vingança pode estar do
avesso. Já que os “alemães” nos insultam na exata medida do verão a mais,
afinal o patrono do clima, solidário com os padecimentos dos latinos (da
canícula e dos sacrifícios da crise) mexeu cordelinhos para as massas de ar se
desviarem a preceito. Que é para os “alemães” saberem o que sofremos durante o
verão inteiro. Para deixarem de nos chamar as coisas feias que chamam. E – que
sabe? – um clima do avesso, com o norte a saborear o tempo do sul e o sul a
experimentar a teimosia de um outono metido primavera adentro, não seja o
cimento da solidariedade que falta na Europa.
Sem comentários:
Enviar um comentário