2.5.18

Dentes de leão


Mercury Rev, “Holes”, in https://www.youtube.com/watch?v=Y_2c_E_c-U0
Esta “base inconcreta da loucura”, este farol exaurido, esta combustão que arde em seu próprio fogo: os covardes não se imolam em fogo nenhum, muito embora se lhes solte, amiúde, a língua de trapos da denúncia e se esqueçam que não muito tempo antes se desfaziam em públicas genuflexões diante dos agora denunciados. 
Há nesta covardia um abjeção total, o enfraquecimento dos covardes sem que o consigam apreciar, pois convencem-se, do púlpito do anonimato (que costuma cobrir as denúncias), que são tutores de uma imensa coragem. Não sabem, por falta de cognição, que são cadáveres de si mesmos, envoltos na mortalha de uma covardia disfarçada de bravura. Espetam os seus dentes de leão nas personagens que se põem a jeito do papel de vítimas sacrificiais. O que inquieta é o duplo rosto dos que se emaranham nos corredores do conhecimento, os que jogam com a informação como fonte de poder, e atiram as vítimas sacrificiais para a arena do ultraje público, quando dantes foram elogiadas, respeitadas, convidadas, glosadas, procuradas para a obtenção de sinecuras e de benesses. 
Agora, por uma cósmica conjugação de circunstâncias, caem em desgraça mercê dos dentes de leão das alcoviteiras que transacionam conhecimentos e influências. São, esses dentes de leão, matéria putrefata. O espelho irremediável onde se incensa, mas lentamente, um espírito comum. Não se dirá que tudo fica adulterado: os soezes tráficos de influências, que jogam com pessoas como se fossem meros peões num xadrez jogado, são matéria habitual, um património a caminho de se tornar genético. Não proponho lapidações, nem abjurações. Deixo para os lugares próprios os julgamentos, pois a esses lugares pertence a correspondente legitimidade. 
Dirão que se não fossem os covardes que transacionam personagens para os altares sacrificiais, se não fossem as suas anónimas malsinações, crimes ficariam fora da alçada do conhecimento e a usura teria prémio através da indiferença perante o que é impossível conhecer. Não me convenço. Não gostaria de amesendar com um destes justiceiros, por não poder garantir a segurança de meu paradeiro futuro. São como mastins que aferroam seu dente pútrido, como meliantes que delinquem no furto de carteiras alheias. O pior dos males, é que são rostos sem rosto, gente possivelmente comum que anda entre nós, gente malnascida que não hesita em transacionar outros, gente que se alambaza, com um prazer obsceno, a assistir ao público julgamento de que foram detonadores.
Os fins não são garantia de quaisquer meios. Dispenso estes covardes de algibeira que pertencem ao mais baixo estalão de todos nós.

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