Sharon Van Etten, “Comeback Kid”, in https://www.youtube.com/watch?v=h4mewwymxbI
Qual é a probabilidade de um acontecimento? Pergunta consuetudinária que incendeia o horizonte onde se projeta o pensamento. Se calhar, vezes de mais. E vezes de mais porque se colhe na haste da especulação: trata-se de antecipar o futuro.
Quando dizemos “é provável que aconteça (isto ou aquilo)”, estamos a pressupor que o futuro vai ter um certo desenho e que, ao tropeçarmos nesse desenho, será uma certa a reação. Este critério tem duas falhas. Primeiro, admitimos que as cores do futuro sejam determinadas, o que não podemos garantir, nem que julguemos que, de acordo com uma teoria das probabilidades de que sejamos lídimos fautores, seja elevada a hipótese de tal acontecimento. Segundo, a contingência recrudesce quando ligamos a consequência à causa: perante o acontecimento (já de si ungido com a incerteza do porvir), a reação provável será uma certa. Não podemos garantir que assim seja. É nestas alturas que parece que somos maus aprendizes da experiência. Era só olhar para trás e colhíamos, aos pares, exemplos de como o comportamento havido foi diferente do que pressupúnhamos quando se teorizavam hipóteses de acontecimentos antes de eles terem acontecido.
Em vez da teoria das probabilidades, com o flanco tão aberto ao malogro, melhor critério será esboçar a probabilidade das teorias. Em vez de teimarmos na improvável presciência (porventura, das poucas probabilidades assertivas), em vez de continuarmos agarrados a um oráculo que tantas vezes se desmente a si próprio quando o futuro se cumpre, profícuo seria teorizar – teorizar sobre o que viesse parar ao cais onde se acolhe o pensamento. Por mais estéril que seja o exercício de teorização, bem entendido: é que, enquanto se teoriza, o pensamento exercita-se. E enquanto se exercita o pensamento, estamos agarrados à dimensão do tempo que importa – o tempo presente.
A probabilidade das teorias é a recusa dos tempos sem resgate. Não podemos encontrar alimento no pretérito (a não ser um módico de experiência, quando a memória embaciada não o prejudicar). Nem podemos ter a pretensão de agarrar o futuro pelo rosto, pois nem sequer sabemos qual é o rosto do futuro. A teoria das probabilidades é a matemática demonstração da impossibilidade de garantir o futuro. A probabilidade das teorias é o aval de que não se desperdiça o tempo que interessa, aquele de que temos imagem tangível, o tempo de que nos alimentamos – o tempo presente.
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