James Blake ft. Rosalía, “Barefoot in the Park”, in https://www.youtube.com/watch?v=dxef-unujGg
Improcedente, o pedido que se soergue das veias, excruciante, à medida dos escombros onde a alma se esconde. O coração vertiginoso convoca a impaciência (ou é a impaciência que fermenta o coração vertiginoso, já não sabe). Talvez os pequenos passos, um de cada vez, já não sejam critério ajuizado. Fora-o, outrora. Outrora: quando o tempo era vagaroso e todo o tempo em espera parecia uma estrada infindável, por mais que a soubesse finita.
Nas bermas da existência (onde tudo era o caos feito de arbustos desorganizados, uma poça de água encardida, provas de passos dos outros, a escombreira de uma vida deitada fora), esperava que o sol despontasse entre o céu ocupado pelas densas nuvens. O tempo estava a contar. Irremediável na sua marcha, fazendo jus aos alarmes da impaciência. Outra vez o coração vertiginoso, um lampejo de angústia a subir pelo corpo, apertando o peito ao ponto de fazer cortar a respiração. Parecia que tudo se havia suspendido. O trânsito estava emoldurado numa fotografia. As nuvens deixaram de pentear o céu com a ajuda do vento veloz. Do outro lado da estrada, o cão vadio e macilento desinteressava-se de tudo. Ele não imitava o estado imóvel em que tudo o resto se encontrava. Ele, e o relógio que era maior do que todo o seu corpo, com os segundos compassados a percutirem o pulso, dando notícias do tempo furtivo que mantinha a impaciência num frémito.
Podia ter aprendido. Já não era novo e podia atestar que o espólio de experiências dava para abastecer, e com farta matéria-prima, as páginas de um livro. Nem que ele fosse o único leitor do livro. A maldita impaciência era o rumor mais alto, a voz que ensurdecia o pensamento. Por esta hora – pensava – já devia ser noite. E, contudo, a mesma luz timorata mantinha-se como pano de fundo do cenário que teimava em sua inércia: depois de todo aquele tempo, eram os mesmos arbustos desorganizados, a mesma poça de água encardida, as mesmas provas dos passos dos outros, a mesma escombreira de uma vida deitada fora – o mesmo trânsito emoldurado numa fotografia, as mesmas nuvens que penteavam o céu com a ajuda do vento veloz, o mesmo cão vadio e macilento desinteressado de tudo. E ele, contrariando o palco montado, não entregue à inércia, mas parado no mesmo lugar.
Afinal, a impaciência era um rudimentar estado de alma. O remédio (santo, para convocar a ajuda divina de que, todavia, não era crente) era aproximar-se do limiar da berma, onde o asfalto se fundia com a terra baldia, metendo pé ante pé caminho ao caminho. Só para ver onde ia dar a estrada, contra os conselhos do relógio que tanto pesava no seu âmago.
Sem comentários:
Enviar um comentário