2.9.25

Podia haver uma lua velha

Deftones, “Milk of the Madonna”, in https://www.youtube.com/watch?v=D1zErtM1r2c

Uma inspeção cuidada à lua revela que não foi inventariada uma lua velha. E, todavia, a lua já é mais velha do que muita da História, o que seria suficiente para promover uma lua anciã. Talvez os habituais embaixadores de conspirações venham denunciar uma conspiração contra a terceira idade (uma parte do idadismo que conquistou espaço no vocabulário em curso): até a lua é omitida quando se peticiona a hipótese de existir uma lua velha.

A lua velha era uma boa ideia. Não para agradar aos descontentes do idadismo, mas para aproveitar as regalias que a experiência da idade nos lega. A lua velha seria um oráculo. Podíamos ler as suas cicatrizes para perceber que danos haviam sido causados para que essas cicatrizes tenham ficado tatuadas na pele da lua. A pele da lua seria um mapa a desvendar o sarcófago do futuro, para os interessados.

A lua velha seria a caução de todas as luas que estivessem por nascer. Elas não nasceriam órfãs, como se supõe ao apreciar a lua nova como uma fugaz e pouco nítida sombra que prenuncia o enchimento posterior que dará origem às várias fases de uma lua. Quando nascesse uma lua nova sabendo da existência de uma lua velha, ela não ficaria desorientada no remoto horizonte, quase anónima por a lucidez terrena não ter meios para a retratar. 

Pela lua velha passaria toda uma sorte de perguntas. Como se fosse um arquivo vivo e imorredoiro, que não há suspeita, formulada por peritos, da futura morte da lua. A lua arcana tem recursos capazes de resgatar do passado as respostas que satisfazem as demandas feitas. Seria como os anciãos em quem é depositada a responsabilidade de prover o destino comum. 

A lua velha não envelhece mais. Ela atingiu um estado de envelhecimento perpétuo e insuscetível de posterior decadência. Seria uma lição para os mortais que se amedrontam com a temível espada do envelhecimento. Por via das dúvidas, os tementes podem respeitar o sortilégio dos vinhos envelhecidos que se distinguem dos demais como vinhos de superiores pergaminhos. 

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