9.10.20

Bagatela (de onde vem o amanhã?) (short stories #265)


The Durutti Column, “Tomorrow” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=LkvbYHFUPFM

          Não apetece o tirocínio: a espera faz-se na espera, por dentro de um labirinto que congraça as suas vítimas. Um lúdico esgar confronta a matéria do tempo. As vivas almas não dão de si. Mantêm-se em hibernação. O que se passa à sua volta é como se não passasse à sua volta. Regressam os fantasmas. Falam de conceitos. De vinganças. Que não se servem na combustão do sangue em ebulição; esperam para, em carne fria, desembestarem a artilharia. Alguém protesta: “estes relógios estão avariados.” Deixaram de ser serventuários da pior das tiranias. O muco da fala extática agarra-se ao parapeito das palavras tiradas da sua ordem. É preciso um novo entendimento para entender de onde vem o amanhã. Os mais ousados, os que nunca temem empreitadas (por pesadas que sejam), estariam em condições de assegurar que não se intimidam com a demanda. Perguntem-lhes, eles sabem de onde vem o amanhã: “a sua fonte é a véspera que é a sua caução.” É provável que a resposta não seja convincente. Entretanto, os tutores das certezas sem tergiversação saíram de palco. Fugiram. (Diriam sempre que não.) Fugiram do escrutínio que se posterga quando for a altura do acerto de contas. Se a sua profecia não se confirmar, ninguém pode pedir prestação de contas. Jã não serão postos em embaraço por terem negligentemente acrescentado, ao anteriormente exposto, “é bagatela!” Ruminando na sua irrelevância, os promitentes do nada abraçam as frívolas coisas que os mantêm. Mal de quem os quis ouvir. Sempre dirão, em sua defesa, oxalá tivessem ouvido o bramido dos fantasmas, que não aconselhava o aconselhamento junto dos senhores do oráculo. “De onde vem o amanhã?”, perguntavas, quase ininterruptamente. Não quiseste saber a resposta no que ao hoje diz respeito. Preferiste esperar por amanhã.

Sem comentários: