1.10.20

Último reduto (short stories #262)

Blur, “I Broadcast” (live at Later with Jools Holland), in https://www.youtube.com/watch?v=nkggNN1KNdg

          Não se considerem os lugares ermos; por inóspitos serem, ou por inóspitos deles se fazer a ideia, não se considerem. O repasto é consensual quando se acolhe na verossimilhança de um lugar. É um pouco como os hunos que saem da terriola em turismo e a primeira demanda no lugar forasteiro é encontrar um bar que faça lembrar a terriola. A lógica do menor esforço não aconselha grandes cometimentos. Por cima dos imperativos, a retórica dos que rasgam do aceitável os modos de viagem que agridem o ecossistema. Talvez lhes pareça melhor serem iconoclastas do sedentarismo. Já não interessa sermos prodigamente cosmopolitas. As avenças hodiernas cuidaram de mudar os alinhavos do aceitável. Quem quiser procurar o seu último reduto, não vá longe: o reduto pode ser longínquo, inacessível, e estar na contingência de um lugar vizinho. Não são as distâncias físicas que importam. É o recolhimento interior. Há quem assegure que consegue ser asceta no meio do bulício de uma cidade em hora de ponta. O desligamento apura-se na participação do espírito. Congeminam-se as frases indisputáveis como argumento que protesta o último reduto. Em cachos, a solidão apalavra-se no fuso do tempo, sem esquadria. Possam ser tolerantes as marés que vierem de passagem. Sob vigilância dos estorninhos que usam a copa das magnólias ainda despidas de flor, aceita-se a água madrigal que se oferece sem remetente. Olhando para trás, já não se vêm os despojos. Já não são lembrados, os despojos. O canto lúgubre dos chacais esconde-os da vista ávida. Desamarram-se as braçadas que se atiram ao rio que avança, prolixo, para a senescência. As braçadas derrotam a corrente tresmalhada do rio. Sob a escolta de um dia soalheiro, o corpo enregelado retira-se do rio e descobre o seu último reduto, um lugar ermo, de tão perto, que ninguém desenhou nos mapas. 

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