Na orfandade em que caiu a “direita” doméstica (quando espantosamente se situa o PSD como partido de direita), há quem procure o D. Sebastião que recupere a auto-estima destes quadrantes. Depois do desastre santanista e do epílogo de Paulo Portas, fala-se com insistência na refundação da “direita”. Com a aproximação do congresso do PSD, por entre o descontentamento do “mais do mesmo” que os dois candidatos ilustram, a busca da figura sebastiânica acentua-se. António Borges é a noiva prometida, a luz ao fundo do túnel que mostra o caminho a seguir. Outros, mais ousados, atiram os nomes de outros Antónios: Mexia e Carrapatoso.
A confirmar-se o lançamento de um destes nomes para a ribalta do PSD – seja agora, seja a médio prazo – é como se a iniciativa “Compromisso Portugal” fizesse uma OPA sobre aquele partido. E, de caminho, estendesse a OPA à própria política caseira. Inevitável, há quem suspeite das boas intenções destas personalidades que se distinguiram no meio empresarial. Argumenta-se que “estas iniciativas (…) tresandam a yuppies que tiveram sucesso na gestão e na finança e que agora, impolutos, querem saltar para a actividade política”.
Não tenho procuração de nenhum dos Antónios. Tenho todo o à vontade para discordar daquele ponto de vista, tanto mais que nem com a possível liderança de um daqueles Antónios o PSD recolheria o meu voto. Mas tenho que discordar frontalmente daquela sentença. É ela que tresanda a qualquer coisa, algo que exala o odor bafiento da política que se faz da mesma forma, com os mesmos actores que, eles sim, estão longe da condição impoluta. Quando se desconfia das intenções de Borges, Carrapatoso ou Mexia (ao saírem da gestão empresarial para a política), esquece-se que materialmente eles só têm a perder com a transferência. Há que o reconhecer, sem ingenuidade, que terão que ganhar algo com a troca. Há que o reconhecer, ao longo de anos amealharam um invejável pé-de-meia com o desempenho profissional. Como há que o admitir, a passagem para a política pode-lhes granjear um reconhecimento público que não têm enquanto estiverem no reduto empresarial.
Há algo que me atrai na fórmula. Quando se equaciona a possibilidade de personalidades que se distinguiram no firmamento empresarial virem para a política, é de refrescamento da política que se fala. Introduz-se um salutar factor concorrencial. Em vez de políticos profissionais e carreiristas que nunca tiveram contacto com o “mundo real” – o das empresas, que geram riqueza – a entrada em cena de empresários que se reconvertem em políticos é uma lufada de ar fresco. Com a vantagem de se abrirem as portas a pessoas que estão habituadas a gerir bem, a alcançar fórmulas de sucesso, a produzir riqueza.
Não estamos no domínio dos políticos arrivistas, com uma longa trajectória desde as juventudes partidárias, ou de outros que se colam com oportunismo aos becos do poder. Estes não sabem o que é gerir recursos escassos. Nem sabem que sobre eles pesa uma espada afiada, caso os recursos sejam geridos com irresponsabilidade. Não é o universo dos gestores públicos, que ora gerem empresas públicas ora vestem a camisola de políticos, dessas aves raras que saltam de empresa pública em empresa pública para cavar mais um buraco financeiro, desbaratando os impostos pagos pelos contribuintes. É este o paradigma do político profissional. Com os resultados desastrosos que se conhecem.
Mudar de ambiente pode trazer resultados positivos para a qualidade da governação. Seja porque os novos políticos, vindos da gestão de empresas privadas, chegam ao poder e aumenta a expectativa de as decisões políticas sejam mais racionais; seja porque, remetidos à oposição, actuam como um estímulo concorrencial para os detentores do poder: quem governa terá que estar alerta às críticas e propostas alternativas que são verdadeiras alternativas de governação, e que podem cativar a atenção dos cidadãos.
Sei que há um mau exemplo da osmose entre o meio empresarial e o meio político: Berlusconi em Itália. É a imagem de um homem que conseguiu conquistar o poder e que, entretanto, tem tomado decisões que lhe permitem escapar às malhas da justiça em que estava enredado. Não se confunda a árvore com a floresta. Nenhum dos Antónios de que se fala tem problemas com a justiça (que se saiba). O que se lamenta é que haja pessoas que continuam agarradas às fracas figuras que se passeiam na passerelle política, como se estivessem satisfeitas com o desempenho. Só não sei se é limitar as expectativas por uma bitola inferior, ou se é o elogio da mediocridade.
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