19.7.05

As profecias do Bloco de Esquerda


Consta que pessoas ligadas ao Bloco de Esquerda (BE) andam por aí a espalhar a boa nova. Vão avisando que os países que estiveram na cimeira dos Açores, que decidiu a invasão do Iraque, já passaram pelo tenebroso carimbo dos actos terroristas. Bush esteve nas Lajes, os Estados Unidos já sofreram na pele os ataques da Al-Qaeda. Aznar esteve nas Lajes, Madrid foi palco de atentados em 11 de Março do ano passado. Ainda estão vivas as recentes imagens das bombas em Londres, e Blair também se deslocou à “cimeira da guerra” nos Açores. O êxtase da linha de raciocínio está para vir: quem foi o anfitrião? Durão Barroso, na altura o primeiro-ministro deste pacato recanto plantado na extremidade ocidental da Europa.

Pela lógica bloquista, que nos preparemos porque Portugal será o próximo alvo dos terroristas. Faz todo o sentido. Um após um, os países sentados à mesa das negociações na base das Lajes têm sido atormentados pela sanha do terrorismo. Falta apenas o anfitrião. Será uma questão de tempo. Adivinho os Rosas, Portas, Dragos, Fazendas, Louçãs e apaniguados a excitarem-se de contentamento pela perspectiva de uma cidade lusitana ser vítima de um covarde ataque. Só para que possam vir apregoar o monopólio da razão – a retórica cansativa que os vemos a desfiar nas suas aparições públicas, quando falam do alto da sua sabedoria e reduzem à insignificância os ouvintes que têm o privilégio de escutar as suas sábias prédicas. Mostrar a razão será mais importante do que chorar as vítimas que os ataques terroristas possam fazer. Parece que desejam ardentemente que o terrorismo dos fundamentalistas islâmicos faça uma aparição entre nós.

Sobre a irresponsabilidade da profecia não vale a pena perder muito tempo. Se é verdade que este grupelho de trotskistas reciclados consegue penetrar numa fatia considerável da sociedade, a profecia anuncia um alarmismo indigno para quem devia ter a responsabilidade de não atirar para cima da mesa cenários catastróficos que estão longe de corresponder à verdade. Aqui entramos no domínio da subjectividade. Adivinhar onde será o próximo ataque terrorista de larga escala é como procurar uma agulha num palheiro. Afinal a Indonésia não esteve nos Açores e Bali foi fustigada pelos semeadores do terror. Um pormenor que terá escapado às mentes brilhantes que andam pela sede do BE. A minha intuição diz-me que Portugal é um alvo insignificante para a agenda mediática dos fundamentalistas islâmicos.

Mas o oráculo à disposição do pessoal do BE dirá o contrário. Fica por descobrir se é política rasteira (arte em que são mestres), se é apenas uma anomalia técnica do oráculo consultado pelas anacletas figuras da política nacional. Cheira-me a esturro, ainda assim. Há sensivelmente um ano, a malta do BE plantou outdoors apocalípticos para as personagens envolvidas na cimeira das Lajes. Em parangonas, previam o decesso político de Bush, Blair, Aznar e Durão. “Eles mentem, eles perdem”, vaticinava o cartaz, para comprazimento da turba que se excita com a elevada imaginação que veste a propaganda do BE. Bush foi a eleições e ganhou; Blair foi reconduzido (estas vitórias não me encheram de contentamento – longe disso – a não ser pela satisfação de ver as “previsões” laudatórias do BE desmentidas); Aznar e Durão Barroso não foram derrotados, porque não foram a votos (o nosso ex-primeiro-ministro até foi premiado pessoalmente com a presidência da Comissão Europeia). O BE estava redondamente enganado! Ou o oráculo estava avariado…

Insistem no mesmo oráculo, na arte da adivinhação. Uma dimensão onírica de que a política de ralé do BE não consegue escapar. Por entre muito "wishful thinking" e irresponsabilidade, vão tentando construir o futuro antes de tempo. A extensão da postura professoral, das verdades incontornáveis, do género "está-se mesmo a ver que o que dizemos é a verdade e não há outra maneira de ver as coisas". Nada de novo para um grupo que convive mal com a tolerância de ideias diferentes. Um cheirinho do que seria uma democracia se esta gente algum dia conseguisse chegar ao poder.

Entretanto, ficamos à espera que a profecia do BE se cumpra. E que a devastação e a morte se instalem num acto de terror perpetrado por um árabe que vive junto de nós. Alegre e esperançadamente à espera, para caucionar o império da razão que lhes assiste.

1 comentário:

Anónimo disse...

Sem comentários de maior pois o próprio artigo fala por ti.
A angústia da tua insegurança faz com que te enfureças com aqueles que admiras.