O povo ladino, enfim, no dia do entretenimento estival. A sublime comunhão do povo nativo com os emigrantes de regresso à santa terrinha. Cuidam os santos que a festa venha abençoada por um dia soalheiro, quente; o caldo onde nadam os ingredientes da festança viva, com as cinzas do churrasco adejando no ar, misturando o seu calor com o tépido vento do entardecer. O dia ensolarado confere a nota esplêndida ao dia festivo, que o povo merece que os festejos sejam temperados pela bonança da atmosfera, o beneplácito dos santos celebrados.
Romarias, churrascos, garrafões de vinho e muito folclore. À mistura com a multidão que vem, de perto e de longe, desaguar nas terras consagradas pelas romarias conhecidas. Divertimento a rodos. E o bodo aos pobres. O caldo verde e as sardinhas, mais o bolo da Teixeira. Pipocas fervilhantes que estalam na máquina que as faz. Novos e velhos, todos numa algazarra febril. Num dia, num dia que seja, em que as amarguras ficam em banho-maria, adiadas até ao dia seguinte, quando a ressaca do vinho pontua com uma dor de cabeça a dor de parto da romaria.
De alto a baixo, do litoral ao mais recôndito lugar do interior, festarolas de fio a pavio. Com as idiossincrasias regionais, os usos locais, a jactância da gastronomia característica, os sons do folclore típico que ecoam como acompanhamento inato da festa. E foguetório. Do fátuo foguetório que troa ensurdecedores petardos ao raiar da alvorada, chamando os foliões para o dia de festança, que se faz tarde e o dia é curto. Ao fogo vistoso ao bater da meia-noite, em despedida até ao ano que vem, um bouquet de cores que se desfaz no ar para comprazimento dos olhares já toldados pelo muito álcool que escorre nas veias.
Insaciável, o povo agita os corpos no bailarico. Os mais novos e os de meia-idade, que os ossos cansados dos idosos remetem-nos à condição de nostálgicos espectadores. O lamiré para a coreografia desalmada dos corpos foi dado pelo concerto do artista pimba que faz as delícias do povaréu. Melodias xaroposas e as letras imponderáveis arrebitam os corpos. E o cheque chorudo que o artista arrecada entre uma multidão de indefectíveis fãs e dos outros, desconhecedores da poda, que vão na onda e começam por bater o pé contagiados pela febre que corrompe os corpos dançantes.
No dia da romaria, a realidade entra em parêntesis. Não há choros, nem lamentações. Só as viúvas continuam a mostrar tristeza, não se querendo despojar das vestes negras que as acompanharão até ao dia derradeiro. O dia da romaria é quando o povo é acometido por um acesso de generosidade que excepciona a regra dos dias restantes. Tal como para os artistas pimba, que têm por estes dias de Agosto a colecção de cachets que chegam para o resto do ano, a romaria é benfazeja para os mendigos. O instinto de sobrevivência trá-los aos sítios das romarias, sabedores da generosidade momentânea do povo inebriado. Os minutos que passam têm o odor mágico que excita as massas – e aplaca os maus instintos, fertilizando o terreno que é árido para a generosidade no resto do ano.
Nas romarias, o povo antecipa a despedida do Verão. Combina-se com os emigrantes que pavoneiam a afluência material e a língua materna maltratada. É uma espécie de equinócio adivinhado, a mais de um mês de distância. O calendário religioso providencia o feriado da praxe, o pretexto para as celebrações que o povo tão devoto traz para a arena do paganismo. A procissão confere o momento de seriedade, um intervalo na folia popular. Ou apenas a temperança que curte as carnes para os excessos que vêm a seguir, com os artistas pimba a resvalarem para o chinelo, o impropério que profana a seriedade religiosa do feriado celebrado em festança popular. Por um dia, um dia que seja, o povo deixa as lamentações, deixa de ser um povo sofredor. Não há lágrimas para carpir. Somente fartos sorrisos temperados pela salmoura alcoólica e pelo inebriamento da música que ecoa a toda a hora. As cicatrizes escondem-se, cauterizadas pela terapêutica romaria.
O dia das romarias é o dia em que sair de casa é um lancinante apelo à maceração do espírito. É o dia em que a prisão da residência não é prisão, é um bálsamo regenerador.
Romarias, churrascos, garrafões de vinho e muito folclore. À mistura com a multidão que vem, de perto e de longe, desaguar nas terras consagradas pelas romarias conhecidas. Divertimento a rodos. E o bodo aos pobres. O caldo verde e as sardinhas, mais o bolo da Teixeira. Pipocas fervilhantes que estalam na máquina que as faz. Novos e velhos, todos numa algazarra febril. Num dia, num dia que seja, em que as amarguras ficam em banho-maria, adiadas até ao dia seguinte, quando a ressaca do vinho pontua com uma dor de cabeça a dor de parto da romaria.
De alto a baixo, do litoral ao mais recôndito lugar do interior, festarolas de fio a pavio. Com as idiossincrasias regionais, os usos locais, a jactância da gastronomia característica, os sons do folclore típico que ecoam como acompanhamento inato da festa. E foguetório. Do fátuo foguetório que troa ensurdecedores petardos ao raiar da alvorada, chamando os foliões para o dia de festança, que se faz tarde e o dia é curto. Ao fogo vistoso ao bater da meia-noite, em despedida até ao ano que vem, um bouquet de cores que se desfaz no ar para comprazimento dos olhares já toldados pelo muito álcool que escorre nas veias.
Insaciável, o povo agita os corpos no bailarico. Os mais novos e os de meia-idade, que os ossos cansados dos idosos remetem-nos à condição de nostálgicos espectadores. O lamiré para a coreografia desalmada dos corpos foi dado pelo concerto do artista pimba que faz as delícias do povaréu. Melodias xaroposas e as letras imponderáveis arrebitam os corpos. E o cheque chorudo que o artista arrecada entre uma multidão de indefectíveis fãs e dos outros, desconhecedores da poda, que vão na onda e começam por bater o pé contagiados pela febre que corrompe os corpos dançantes.
No dia da romaria, a realidade entra em parêntesis. Não há choros, nem lamentações. Só as viúvas continuam a mostrar tristeza, não se querendo despojar das vestes negras que as acompanharão até ao dia derradeiro. O dia da romaria é quando o povo é acometido por um acesso de generosidade que excepciona a regra dos dias restantes. Tal como para os artistas pimba, que têm por estes dias de Agosto a colecção de cachets que chegam para o resto do ano, a romaria é benfazeja para os mendigos. O instinto de sobrevivência trá-los aos sítios das romarias, sabedores da generosidade momentânea do povo inebriado. Os minutos que passam têm o odor mágico que excita as massas – e aplaca os maus instintos, fertilizando o terreno que é árido para a generosidade no resto do ano.
Nas romarias, o povo antecipa a despedida do Verão. Combina-se com os emigrantes que pavoneiam a afluência material e a língua materna maltratada. É uma espécie de equinócio adivinhado, a mais de um mês de distância. O calendário religioso providencia o feriado da praxe, o pretexto para as celebrações que o povo tão devoto traz para a arena do paganismo. A procissão confere o momento de seriedade, um intervalo na folia popular. Ou apenas a temperança que curte as carnes para os excessos que vêm a seguir, com os artistas pimba a resvalarem para o chinelo, o impropério que profana a seriedade religiosa do feriado celebrado em festança popular. Por um dia, um dia que seja, o povo deixa as lamentações, deixa de ser um povo sofredor. Não há lágrimas para carpir. Somente fartos sorrisos temperados pela salmoura alcoólica e pelo inebriamento da música que ecoa a toda a hora. As cicatrizes escondem-se, cauterizadas pela terapêutica romaria.
O dia das romarias é o dia em que sair de casa é um lancinante apelo à maceração do espírito. É o dia em que a prisão da residência não é prisão, é um bálsamo regenerador.
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