Continua a melomania, talvez a frustração de nunca ter aprendido música e de tanto dela gostar. Há sons, formatos, projectos, propostas, ritmos, artistas que agridem os tímpanos, ou apenas acusam a negação da estética. E por mais que seja tributário do relativismo, não arrisco cair em incoerência se disser que há sons que escorregam para os umbrais do mau gosto.
Não quero impor padrões estéticos ao confessar a irritação pessoal com o folclore minhoto, com a delirante música pimba que faz as delícias de emigrantes de regresso à terra pátria em Agosto, com certos ícones de música “pop” que empertigam adolescentes a braços com a borbulhagem que irrompe fruto de altercações hormonais, e com o meu odiozinho de estimação, David Fonseca. Não é intenção impor nada. Mas como não meço os meus padrões pela bitola dos outros, não me preocupa que haja quem goste daqueles estilos, daqueles artistas. Não ofendo o relativismo se fixar a inestética dos exemplos que acabei de fornecer. E se alguém viesse esgrimir argumentos a negar qualidade de outras músicas que reúnem as minhas preferências, só daria razão pela liberdade de opinião que a todos toca.
Noutros casos, não diria que é franqueada a porta do mau gosto: trata-se de sons pouco conhecidos, pelos menos no mercado do que é trazido à audição comum, e que agridem como se fossem instrumentos de tortura. Há um estilo musical que se encaixa à perfeição no protótipo. É uma música pouco conhecida do grande público, circulando no circuito nocturno, nas discotecas da moda. No afã de catalogar estilos musicais, há quem lhe chame trance, ou house, ou lá como isso se chama.
Quando acontece dar de caras (neste caso, esbarrar os ouvidos) no estilo, ao fim de alguns minutos noto uma desorientação dos sentidos, como se tivesse perdido o norte. Se por acaso acontece a música ser escutada no interior de uma discoteca escurecida, debitando os sons estridentes enquanto vem acompanhada por um feixe de luzes psicadélicas, o que sinto é que todos os passos são desconjuntados, que as caras que se cruzam parecem ir e vir como se fossem sopradas por rabanadas de vento que piscam ao sabor das luzes que ecoam a batida uivante da música. Não há muita distância da música minimal, pois o trance (ou o house, ou lá o que isso é) não é composição musical elaborada. Há mesmo um troar repetitivo, que entra nos corpos e os leva ao maquinal efeito da dança prolongada, anestesiados pelos uivos que os sedam até ao automatismo dos movimentos.
Das vezes que fui espectador desta música em discotecas senti o seu efeito poderoso, mas torturante. Olhava para a coreografia dos corpos, entregues ao robótico ondular que se repete enquanto os sons se prolongam, também eles repetitivos, por minutos que não parecem acabar nunca mais. Há nesta música, quando misturada com a enigmática escuridão de uma discoteca e o feixe de luzes psicadélicas, um parêntesis no tempo. Que parece suspender-se, demorar-se nos ponteiros retardados do relógio, também eles anestesiados pela música torturante.
Diria que há um efeito hipnótico, um inexplicável efeito hipnótico. Houve uma vez que o pude comprovar. Com vários amigos, numa discoteca algarvia que passava exaustivamente este tipo de música. Um deles juntou-se aos corpos ondulantes que festejavam a orgia de sons trance, ou house, ou lá como isso se chama. Recebeu a companhia de outro. O tempo passava e eles mantinham-se militantes peões da coreografia desengonçada, deixando que a cabeça, os braços e as pernas se entregassem aos gestos autómatos da dança. O cansaço apoderava-se de alguns dos outros, que eram apenas espectadores. Um voluntariou-se para ir chamar os outros. Já não regressou. Outro foi ao local dos corpos dançarinos para resgatar os outros três. E o tempo demorava-se sem que ninguém regressasse. Parecia que pisar o local onde os corpos celebravam a música que gritava a torturante sonoridade tinha um efeito contagiante, um mágico efeito contagiante. Os que lá iam deixavam apoderar os corpos pelo torpor insidioso da música trance, ou house, ou lá como isso se chama.
Confirmou-se: ao próximo que se ofereceu para recuperar os excitados dançarinos, um cenário hipnótico, como se tudo fosse tomado pelos sons repetitivos da música que soava estridente. Um deles disse: “isto pega-se”. Sem darem conta, extasiados pelo hipnótico efeito de uma música torturante. Imagino o efeito quando os neurónios dançam esta música anestesiados por comprimidos de ecstasy.
Não quero impor padrões estéticos ao confessar a irritação pessoal com o folclore minhoto, com a delirante música pimba que faz as delícias de emigrantes de regresso à terra pátria em Agosto, com certos ícones de música “pop” que empertigam adolescentes a braços com a borbulhagem que irrompe fruto de altercações hormonais, e com o meu odiozinho de estimação, David Fonseca. Não é intenção impor nada. Mas como não meço os meus padrões pela bitola dos outros, não me preocupa que haja quem goste daqueles estilos, daqueles artistas. Não ofendo o relativismo se fixar a inestética dos exemplos que acabei de fornecer. E se alguém viesse esgrimir argumentos a negar qualidade de outras músicas que reúnem as minhas preferências, só daria razão pela liberdade de opinião que a todos toca.
Noutros casos, não diria que é franqueada a porta do mau gosto: trata-se de sons pouco conhecidos, pelos menos no mercado do que é trazido à audição comum, e que agridem como se fossem instrumentos de tortura. Há um estilo musical que se encaixa à perfeição no protótipo. É uma música pouco conhecida do grande público, circulando no circuito nocturno, nas discotecas da moda. No afã de catalogar estilos musicais, há quem lhe chame trance, ou house, ou lá como isso se chama.
Quando acontece dar de caras (neste caso, esbarrar os ouvidos) no estilo, ao fim de alguns minutos noto uma desorientação dos sentidos, como se tivesse perdido o norte. Se por acaso acontece a música ser escutada no interior de uma discoteca escurecida, debitando os sons estridentes enquanto vem acompanhada por um feixe de luzes psicadélicas, o que sinto é que todos os passos são desconjuntados, que as caras que se cruzam parecem ir e vir como se fossem sopradas por rabanadas de vento que piscam ao sabor das luzes que ecoam a batida uivante da música. Não há muita distância da música minimal, pois o trance (ou o house, ou lá o que isso é) não é composição musical elaborada. Há mesmo um troar repetitivo, que entra nos corpos e os leva ao maquinal efeito da dança prolongada, anestesiados pelos uivos que os sedam até ao automatismo dos movimentos.
Das vezes que fui espectador desta música em discotecas senti o seu efeito poderoso, mas torturante. Olhava para a coreografia dos corpos, entregues ao robótico ondular que se repete enquanto os sons se prolongam, também eles repetitivos, por minutos que não parecem acabar nunca mais. Há nesta música, quando misturada com a enigmática escuridão de uma discoteca e o feixe de luzes psicadélicas, um parêntesis no tempo. Que parece suspender-se, demorar-se nos ponteiros retardados do relógio, também eles anestesiados pela música torturante.
Diria que há um efeito hipnótico, um inexplicável efeito hipnótico. Houve uma vez que o pude comprovar. Com vários amigos, numa discoteca algarvia que passava exaustivamente este tipo de música. Um deles juntou-se aos corpos ondulantes que festejavam a orgia de sons trance, ou house, ou lá como isso se chama. Recebeu a companhia de outro. O tempo passava e eles mantinham-se militantes peões da coreografia desengonçada, deixando que a cabeça, os braços e as pernas se entregassem aos gestos autómatos da dança. O cansaço apoderava-se de alguns dos outros, que eram apenas espectadores. Um voluntariou-se para ir chamar os outros. Já não regressou. Outro foi ao local dos corpos dançarinos para resgatar os outros três. E o tempo demorava-se sem que ninguém regressasse. Parecia que pisar o local onde os corpos celebravam a música que gritava a torturante sonoridade tinha um efeito contagiante, um mágico efeito contagiante. Os que lá iam deixavam apoderar os corpos pelo torpor insidioso da música trance, ou house, ou lá como isso se chama.
Confirmou-se: ao próximo que se ofereceu para recuperar os excitados dançarinos, um cenário hipnótico, como se tudo fosse tomado pelos sons repetitivos da música que soava estridente. Um deles disse: “isto pega-se”. Sem darem conta, extasiados pelo hipnótico efeito de uma música torturante. Imagino o efeito quando os neurónios dançam esta música anestesiados por comprimidos de ecstasy.
1 comentário:
vc realmente nao sabe nada sobe trance
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