4.1.10

Mágoa dos ambientalistas: a maioria não quer que o tempo volte para trás



Um inesperado ciclone varreu tudo na zona de Torres Vedras. Depois vieram as complicações na vida das pessoas: já não apenas arrumar o que o vento selvagem desarrumou; o pior estava para vir: muitos postes de transporte de electricidade ficaram inanimados no solo. Muita gente ficou sem electricidade. Muita gente passou a véspera de natal à luz das velas e de candeeiros a petróleo.

A seguir, escutavam-se as queixas. As legítimas lamúrias eram entrecortadas por pomposas declarações que aliviavam a responsabilidade da EDP. Um engenheiro de operações e um vice-presidente da empresa souberam dizer que os postes não aguentam ventos a soprar a 220 quilómetros por hora. (Alguém confirmou a veracidade do registo?). Enquanto as pessoas continuavam sem luz, num involuntário recuar no tempo, responsáveis da EDP desdobravam-se em explicações para a demora no restabelecimento da electricidade.

Não importa a incapacidade da EDP. A não ser isso mesmo: registar a incapacidade, a sintomática incapacidade para dar resposta em tempo útil a esta anomalia. O mais importante é ser espectador de vidas viradas de cabeça para baixo e tirar ilações. Só para aborrecer os adoradores da causa ambientalista e furar o quase consenso que amesquinha quem duvidar das verdades científicas e dos cenários catastróficos que saem da pena dos ambientalistas. Mal o meu, o de me causarem alergia os consensos forçados.

As pessoas que ficaram sem luz foram obrigadas a viver um punhado de dias à luz da vela ou com a ajuda de candeeiros a petróleo. O tempo voltou para trás, à força. Eis o simbolismo do ciclone em Torres Vedras: para muitos fundamentalistas do ambientalismo, a única solução para a salvação do ecossistema planetário é recuar no tempo. Devemos prescindir de serviços que nos garantem conforto, pois o preço do conforto é – alegam embrenhados no seu catastrofismo – o abismo do planeta lá mais para a frente. Só que as pessoas estão-se nas tintas para as sagradas verdades dos ambientalistas quando são forçadas a viver de acordo com os parâmetros de outrora. Se nada acontece quando carregamos no interruptor do candeeiro, sentimos a vida de pantanas. Os ambientalistas que vivam no desconforto lírico de "um amor e uma cabana".

Há exemplos que educam na sensibilidade ambiental. Quando chega a canícula ao Japão, os executivos não vão trabalhar de fato e gravata para se poupar no ar condicionado (que faz mal ao buraco do ozono). Agora está na moda a "peugada ambiental", com instrumentos que ajudam a medir o dano que causamos no meio ambiente. Talvez o exemplo mais antigo seja a separação dos lixos, contribuindo para a sua reciclagem. O grande filão das energias alternativas até dá direito a desconto nos impostos que somos obrigados a pagar. O filão que se anuncia é o dos automóveis sustentáveis do ponto de vista ambiental, a progressiva invasão de carros eléctricos para não estarmos tão dependentes da queima de energias fósseis que degradam o meio ambiente. Não é que me interesse provar credenciais de sensibilidade ambiental, mas estes exemplos merecem aplauso.

O mal está nos exageros. E quando esses exageros fermentam o paternalismo dos ambientalistas, que do alto da sua suposta autoridade intelectual e científica desatam a dar ordens sobre o que não podemos fazer, subitamente esqueço-me do que é o ambiente. O grande dilema dos sacerdotes do ambientalismo é que as pessoas estão no legítimo direito de recusarem ver a vida andar para trás quando a sensibilidade ambiental persuasivamente ordena que tenham hábitos de vida que lhes retiram certas comodidades.

Estamos tão habituados a essas comodidades, que não consigo evitar estas interrogações. Quem deseja tiritar de frio dentro de casa quando o inverno rigoroso tomou conta da atmosfera? Quem se coíbe de dar um passeio de automóvel ao fim-de-semana, amedrontado pelos malefícios que o combustível gasto provoca na atmosfera? Vamos deixar de tomar banho todos os dias (e passarmos a aturar o desagradável odor corporal do próximo por onde quer que passemos)? A indústria têxtil e a indústria dos perfumes meteram uma cunha aos ambientalistas? E que mal fez a indústria do turismo para ser discriminada?

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