8.3.10

Um dia internacional da mulher à maneira das feministas exaltadas


Ia afirmar que no centésimo aniversário do dia internacional da mulher a efeméride merece celebração especial. Ia dizê-lo, em homenagem a todas as mulheres – e ao número redondo, a centena. Até estendia o cumprimento às activas feministas de hoje, ainda que as de hoje já não tenham as mesmas razões de queixa que tinham as que foram pioneiras na igualdade entre géneros. Ia a dizer. Mas retirei o raciocínio a tempo: tenho a impressão que o aplauso mais generoso que as feministas gostariam de sentir, hoje que passam cem anos da existência de um dia inteiro consagrado às mulheres, era que a deferência terminasse.

Não é por pirraça ou inveja que sugiro que o dia internacional da mulher deixe de ser festejado. Ou, o que seria ainda pior, por datado marialvismo lusitano. Há alguns machos-alfa que, invejosos pelo protagonismo que as mulheres ganham neste dia, protestam um dia internacional dedicado ao sexo masculino. Argumentam que a igualdade reclamada pelas feministas esbarra na sua própria negação quando fazem constar, assertivas, que não faz sentido o sexo masculino celebrar um dia internacional com a chancela da muito recomendável ONU.

A reivindicação soa mal. Não por concordar com as feministas que se renovam por sucessão geracional, pois elas insistem que ainda há muito caminho por fazer até à mirífica igualdade. É compreensível que para elas haja sempre caminho a desbravar. Sempre discriminações para denunciar com a voz condoída de quem se alista em causas justas e, todavia, perenemente injustiçadas. Enquanto houver discriminações boas por entronizar (as "discriminações positivas" – assim, grafadas a preceito), fará sentido lembrar, por um dia que seja, que há mulheres e elas continuam a ser discriminadas pelos dominantes machos.

Vou por um delírio imaginativo: um dia virá em que, para gáudio das feministas excitadas, a igualdade deixará de ser miragem. E nesse dia, fará ainda sentido arrebanhar um dia inteiro à mulher? Manter-se-ão feministas, agora de causa limitada. Assim como assim, nessa altura já não há discriminações (das más) para combater. Serão, por assim dizer, feministas arqueológicas. Curadoras de um museu todo delas, onde se resguardam os vestígios dos atropelos de outrora, quando machos opressores tratavam as mulheres como não deviam. Nem que seja para avivar as memórias, prolongando-as para tempos vindouros, para as gerações de então. Eu digo: nessa altura, ser feminista é paludismo antropológico. A criatura virada ao criador – ou a criatura a fazer-se passar por criador.

Eu gosto das mulheres. Esta frase é ambígua, pois as feministas de espada desembainhada apressar-se-ão a lançar os mastins julgando que a frase encerra o pior do tratamento que se pode dedicar a uma mulher. Mantenho: eu gosto das mulheres. Tenho que esclarecer o sentido da frase? Admito, ela pode conter vários significados. Mas como hoje é dia internacional da mulher, a minha homenagem é declarar que gosto das mulheres. Admiro-lhes a têmpera. A resistência. A delicadeza e a sensibilidade. A mística intuição. O espírito perseverante – elas que, de mansinho, sabem conduzir os homens onde querem. E a beleza, ah, a imensa, atordoante beleza. (Era proibido mencionar a beleza das mulheres, superior à dos homens? Ficam ofendidas por entenderem que há aqui escondida a "coisificação" da mulher que é um sinal permanente de desigualdade? Mandem a queixa às entidades divinas, ou à natureza impura, responsáveis pela genética humana.)

As feministas atiram-se, ferozes, quando um macho quer ser respeitoso e pratica o cavalheirismo, abrindo alas às senhoras. Se elas querem tanto uma igualdade tirada a régua e esquadro, uma igualdade ao milímetro, que sejam as primeiras a vociferar contra o direito internacional da mulher. A centésima vez seria a última. Talvez ficassem enfim satisfeitas: a mulher falsamente glorificada neste dia é como a turba em visita ao jardim zoológico, observando com curiosidade parola os bichos fora do habitat.

E desconfio: que o dia internacional da mulher é a medida ideal para perpetuar a desigualdade.

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