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A Islândia é uma lição. Permanente caixinha de surpresas. Esteve nos umbrais da bancarrota quando ninguém previa que isso pudesse acontecer a um país que transpirava prosperidade. Agora motiva ódios de estimação por causa de um vulcão ter entrado em erupção, deixando em terra milhares de aviões e milhões de passageiros à beira de um ataque de nervos. Se calhar a Islândia faz de propósito. Desterrada no meio do Atlântico, quase a beijar o oceano Árctico, precisa de chamar a atenção. De lá não vêm apenas as paisagens deslumbrantes e a música moderna de fino recorte. Também nos chegam outras excentricidades que fazem da Islândia uma terra peculiar. A Islândia teme a indiferença. Por isso inventa excentricidades.
Anteontem houve eleições municipais. Os partidos habituais não foram varridos do mapa, mas não andou longe de o serem. De repente, sem que ninguém esperasse, um partido recém-criado ganhou as eleições. “É um partido humorístico, fundado pelo comediante Jon Gnarr há seis meses”. O seu nome é todo um programa provocatório: “Melhor Partido”. Isto devia motivar demorada reflexão nos politólogos e na gente que arrasta a asa pelos aparelhos partidários. Ele há melhor designação para um partido? Só têm que convencer uma maioria do eleitorado que são aquilo que corresponde ao seu nome. Pois não votamos nos melhores? (Ou nos menos maus, na lógica da necessidade do voto; ou, na lógica do voto útil, os que convêm – mas isso não vem agora ao caso.)
O seu lema é um desassombro de ingénua honestidade: “vamos prometer o dobro dos outros partidos e cumprir o mesmo: nada”. Os mais sisudos, aqueles que teimam que não se brinca com coisas sérias – e a política é uma delas – dir-me-ão que é insensato votar num partido que promete mentiras. Ainda por cima, mentiras a dobrar. Dirão que o cardápio de promessas é tão risível que não se entende que objectivos tinha o Melhor Partido (MP) e com que programa vai governar. Podem concluir o raciocínio: esta é um cheque em branco que a maioria dos islandeses passou a um partido que não é para ser levado a sério. Agora sujeitam-se às diatribes do momento escolhidas pelos autarcas do MP. Já os vejo, aos sisudos, a olharem para o seu oráculo, avisando: depois não se queixem que os eleitos do MP actuam sem freio.
Eu mantenho que a política se tornou tão enfadonha que a sua oxigenação exige que seja levada na paródia. Mesmo os temas mais difíceis, os assuntos mais sensíveis, merecem tratamento jocoso. É a melhor profilaxia contra as depressões – rir, com a boca bem aberta em sonoras gargalhadas. Se eu quisesse escrever como um politólogo embebido em seriedade, diria que a vitória do MP foi uma severa punição dos islandeses. Uma punição a todos os partidos tradicionais, todos culpados pelo estado calamitoso em que a Islândia mergulhou (desconte-se o vulcão de nome esquisito). Candidato a analista credível, remataria que a maioria dos islandeses está tão cansada que quis punir com dureza os partidos sistémicos, dizendo através do voto que até um partido que não é para ser levado a sério será mais competente. Agora só temos que esperar que o futuro faça a dobra da esquina do tempo.
E se a Islândia se exportasse para cá? (Descontemos: o tempo que por lá faz, a Bjork, os vulcões e o cheiro a ácido sulfúrico.) Manuel João Vieira, as presidenciais são já para o ano!
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